domingo, 20 de maio de 2012

Bruno Torres

Bruno é cineasta. Dirigiu e montou diversos curtas e longas, entre eles está ‘Encontro das Águas’.

Qual é a importância histórica que o curta-metragem tem no cinema brasileiro?
O curta metragem tem importância histórica não só no cinema brasileiro, mas também na própria história do cinema de maneira geral.

A sétima arte praticamente nasceu quando os irmãos Lumière exibiram o filme A CHEGADA DE UM TREM NA ESTAÇÃO, que foi a primeira projeção de um filme ao público. O filme consistia em uma estação movimentada por pessoas aguardando a chegada de um trem. Após um tempo o trem surge e vem em direção à câmera. Na sala de cinema as pessoas começaram a correr e pular as cadeiras, com receio de que o trem as atropelassem.

Isto só foi possível no cinema, já que é a única arte capaz de imprimir o tempo como um evento concreto. Pensando neste filme, é fácil perceber a importância histórica do curta metragem na história do cinema. Além deste caso, existem milhares de outros. Luís Buñuel mudou a história do cinema, com seu curta de aproximadamente 30 minutos, UM CÃO ANDALUZ.

No brasil não foi diferente. Humberto Mauro fez inúmeros curtas, entre eles o clássico A VELHA A FIAR. Humberto influenciou uma geração de cineastas e o Brasil produziu inúmeros curtas de cineastas que no futuro produziram seus longas e se tornaram grandes diretores.

Por que os curtas não têm espaço em críticas de jornais e atenção da mídia em geral?
O espaço para o curta metragem ainda é restrito, mas tem crescido muito. Hoje existem uma centena de festivais que exibem curtas metragens no país e com uma boa assessoria de imprensa, o que acaba gerando, de certa forma, um espaço de divulgação e de discussão a respeito dos curtas metragens produzidos no país.

Mas o que acontece na verdade é que vivemos em um país que não tem a cultura de valorizar a exibição de curtas metragens no cinema e muito menos na televisão. A cultura ela é educada e já que não temos como assistir os curtas em tevê aberta, acabamos, por consequência, tendo também uma mídia restrita. O cinema além de ser arte, é mercado e a mídia e as críticas dos jornais atendem a esse mercado. Como o curta metragem não tem o espaço que atinge diretamente o público, a mídia em geral acaba dando menos atenção.

É uma pena, pois o curta metragem é um espaço de experimentação único e especial dentro do conceito audiovisual. 

Na sua opinião, como deveria ser a exibição dos curtas para atingir mais público?

Acredito que o povo tenha muito interesse em assistir curtas metragens. O curta pode trabalhar situações que num longa seria impossível. A estrutura dramática é outra, o tempo, o ritmo, a necessidade de ser mais sucinto e outras coisas mais. Isso desperta a atenção do público, mas repito: não temos uma educação cultural que nos favoreça e que habitue o olhar do espectador para o curta metragem. O ideal seria ter canais de televisão aberta que exibissem o curta metragem em horários especiais, justamente para habituar o público, já que a televisão é o meio de comunicação mais direta.

Somente após uma conquista destas seria possível exibir curtas metragens em salas de cinema antes dos longas metragens ou até mesmo em sessões especiais. 

Pode parecer uma loucura este pensamento, mas com o tempo a exibição de curtas em tv aberta geraria interesse dos exibidores em salas de cinema. E para finalizar é importante ressaltar também da mídia de internet, que hoje em dia é sem dúvida a mais acessada e de uma importância tremenda. Os espaços de exibições de curtas poderiam ser maiores na internet. Existem poucos sites que exibem curtas metragens.

É possível ser um cineasta só de curta-metragem? Vemos que o curta é sempre um trampolim para fazer um longa...

A maioria dos bons diretores do mundo todo exercitaram suas linguagens e visões nos curtas metragens antes de se tornarem diretores de longas. O curta não é só o trampolim para o longa, ele é a verdadeira faculdade de formação do olhar do diretor cinematográfico. Ele é o espaço onde você pode arriscar para se descobrir, para saber quem você é realmente e que cara o seu cinema vai ter. 

O que acontece é que após você formar seu olhar e definir uma linguagem as necessidades mudam. 

O curta é o formato onde você define seu estilo, mas é no longa metragem que você encontra o diálogo com o público. Por esse e por outros motivos, na maioria das vezes, os diretores de curtas se transformam em diretores de longas. 

Existe também a questão da realidade de produção, já que no longa a verba é maior e condição de trabalho mais propícia. Mas na realidade viver só de curtas ou não é extremamente pessoal. Conheço diretores no Brasil que fazem curtas há 20 anos e ainda não fizeram longas. Quando pergunto a eles sobre longas metragens eles não demonstram interesse.  São raras exceções, mas existe.

O curta-metragem é marginalizado entre os próprios cineastas?
Isso definitivamente eu acredito que não. Os curtas metragens são apreciados por diretores e produtores no Brasil todo. Em alguns festivais, às vezes, as sessões de curtas tem mais público que a sessão de longas. As grandes produtoras do Brasil produzem curtas e longas, pois o produtor sabe que o grande diretor nasce fazendo curta metragem.

Pensa em dirigir um curta futuramente? Qual é o seu próximo projeto?
No momento estou finalizando dois curtas metragens. Um deles é um documentário de observação poética do ciclo das águas que dirigi em parceria com o documentarista e amigo Evaldo Mocarzel. O filme se chama ENCONTRO DAS ÁGUAS e está na reta final da fase de finalização. Além deste projeto estou com outro curta que dirigi juntamente com o coreógrafo Alessandro Brandão. 

O filme na verdade é um média metragem que também está em fase de finalização. O projeto se chama PEQUENA PAISAGEM DO MEU JARDIM e é um filme que une a arte da dança com a arte do cinema. Fora esses dois filmes que já estão filmados, estou com três projetos de curtas que espero rodar antes de dirigir um longa metragem.

Os cinco projetos são todos diferentes e com linguagens distintas. Estou aproveitando o espaço que o curta metragem sugere de experimentação, para definir minha própria linguagem como diretor.