Roberto
Farias
Cineasta
O
filme Os Trapalhões no Auto da
Compadecida é o mais elogiado, dentro da filmografia
do quarteto. Renato Aragão afirmou que fez esse filme para agradar a crítica
especializada, que sempre batia muito forte nele. Foi realmente com essa intenção
que vocês produziram esse filme?
Só
ouvi falar disso depois que o filme foi exibido. Como a bilheteria foi de “apenas” 2.600.317
espectadores, menos do que a maioria dos filmes dele costumava fazer e devido à
qualidade do filme, acho que ele decidiu falar isso como se fosse necessário
desculpar-se.
Certa
vez, Ariano Suassuna afirmou que esse filme foi o melhor trabalho que fizeram em
relação à adaptação da sua obra. Recorda-se disso?
Não.
Não me recordo. Sei que ele gosta. Mas em São Paulo vi Ariano Suassuna dizer
que prefere a versão do Guel Arraes, apesar de gostar muito também da minha.
Como
surgiu o convite para trabalhar com Os
Trapalhões?
Ele
e o Paulo Aragão me convidaram. Viram o sucesso dos filmes do Roberto Carlos,
as correrias, a agilidade da câmera, exatamente como o Renato espera que sejam
feitos os seus filmes.
Antes
de iniciar essa parceria profissional com Os Trapalhões, você
já acompanhava os seus filmes?
A
primeira vez que Renato e Dedé filmaram foi comigo. Um curta-metragem chamado A Pedra do Tesouro. Eles
ainda não haviam formado o grupo dos Trapalhões,
eram uma dupla, que trabalhava na TV Tupi.
Fale
mais desse curta.
Ele
foi feito para enfatizar a força do trabalho, quando todos colaboram. Naquele tempo,
o Consulado Americano contratava alguns cineastas para fazerem curtas-metragens
e, em troca, dava latas de filme 35mm. Fiz Toda
Donzela Tem um Pai Que É uma Fera com
latas de filme que ganhei por esse documentário. O patrocinador era a Aliança Para o Progresso. O
contato era um diplomata chamado Hart Spraeger, de descendência russa. Dizem
que foi preso como espião, anos depois, quando já estava fora do Brasil. Mas
não tenho comprovação.
Os Trapalhões no Auto da Compadecida foi
filmado onde?
Uma
das restrições do Renato era não filmar mais de cem quilômetros distantes de
seu estúdio. Construímos uma cidade cenográfica num terreno da minha produtora,
a R. F. Farias, na Estrada dos Bandeirantes; e fizemos o filme lá.
Quais
as suas recordações dos bastidores desse filme?
Foi
agradável, convivemos em harmonia. Somos amigos. O elenco era ótimo.
O
elenco contava com atores de primeiro nível, entre os quais Raul Cortez, José
Dumont, Renato Consorte. A escalação do elenco partiu de você ou dos Trapalhões?
A
escalação foi minha.
Esse
filme teve um público total de 2.610.371 espectadores, além de ter sido um dos
raros filmes dos Trapalhões que
chegou a ser comercializado no exterior, no caso, para Portugal. Apesar do
sucesso, foi o seu único filme com eles. Quais as razões disso?
Não
falamos em um segundo filme. Mas acho que, daí em diante, o Renato passou a me
ver como diretor de “filme de arte”.
Como
era o seu contato com o quarteto (Didi, Dedé, Mussum e Zacarias)?
Maravilhoso.
Todos muito legais. Profissionais, pontuais, sérios.
Que
representava, naquele período, trabalhar num filme dos Trapalhões, que eram
certeza de sucesso de bilheteria?
Modéstia
à parte, nunca tive problema com a bilheteria. Sempre estive acostumado a fazer
milhões de espectadores e nem me passava pela cabeça que poderia ser diferente.
Quem
era o maior comediante do grupo?
Era
páreo duro. Mas o maior carisma sempre foi do Renato.
Renato
Aragão tem fama de ser perfeccionista. Isso procede? Ele acompanha tudo?
Também
sou perfeccionista. No meu caso, quem se preocupou fui eu. Ele só viu o filme
pronto.
Por
que, na sua visão, os críticos e a Academia rejeitam os filmes produzidos e estrelados
pelos Trapalhões?
Essa
postura é conhecida. Depois de alguns anos, os filmes dele serão “cults”. Mas a Academia que
eu presido não pensa como você está afirmando. Ao contrário, Renato recebeu uma
grande homenagem numa das nossas festas.
Como
classifica o cinema feito pelos Trapalhões?
É um
cinema importante para o Brasil Quando se exibe um filme dos Trapalhões, estamos
ocupando o mercado e cuidando da nossa cultura, em vez de ver um filme
estrangeiro.
Gostaria
que contasse alguma curiosidade ou fato que tenha presenciado como testemunha
ocular.
A
curiosidade maior foi o tempo que eu levei para convencer Ariano Suassuna a me
deixar filmar sua peça. As tratativas começaram em 1960. Mil novecentos e
sessenta. Depois que pedi autorização para filmar, ele ainda cedeu os direitos a
George Jonas, que fez a primeira versão. Mais ou menos vinte anos depois, consegui
que ele me desse autorização para filmar.