O
cinema “abaixo
de 0”
O
Rafael me convidou para escrever um texto para “os curtos filmes” que está
fazendo 5 anos. Topei na hora. Mas depois fiquei quebrando a cabeça sobre o que
poderia escrever. Por fim, resolvi, então, comentar sobre a importância de um
trabalho como este para nossas produções “abaixo de 0”.
Acredito que
este espaço é importante
principalmente para os
curtas metragens, que brinco
aqui, chamando-os “abaixo
de 0”. Curtas
metragens realizados
por cineastas, geralmente
moradores de periferias,
sem recursos financeiros,
mas com muitos recursos
humanos que não possuem
assessores de impressa, nem material gráfico para divulgação ou contato em
Festivais e sem críticos de cinema.
Chamo de cineastas os que fazem do
audiovisual a sua arte, sua expressão de vida, mesmo não se sustentando dela.
Cinema é imagem em movimento, não se define em tempo.
“Os Curtos filmes” nos faz refletir
sobre a importância que o curta-metragem tem na cultura brasileira, mas que ao
mesmo tempo é tão ridicularizado ao ponto de muitas produções estarem na
gaveta. É ir além da exibição, traz a necessidade da discussão sobre o que se
produz.
O curta metragem está tão presente
na cultura brasileira graças a invenção do sistema digital, que podemos
encontrar produções nos lugares mais remotos de nossa sociedade. Mas o sistema
brasileiro de financiamento cultural não consegue sustentar todos e os que
ficam de fora nesta seleção, fazem suas produções “abaixo de 0”. Viramos
pedintes da cultura e pior que pedir esmola é pedir apoio de alimentação para
realizar um curta-metragem e ainda de terror, com certeza ouvimos muito mais
NÃO!. (risos)
Foi neste blog que respondi pela primeira e única vez uma entrevista sobre nossos
curtas-metragens.
Não discutimos e não falamos sobre o
que estamos produzindo, sobre conteúdo, qualidade, desejos, etc. Além do dia do
lançamento, são raros os espaço para este fim. O LEPE Digital (Laboratório de
estudo, produção e experimentação digital) do JAMAC tem como proposta ser um
espaço para estas discussões, além de exibirmos filmes no Cineclube.
O
movimento cineclubista teve seu auge até o inicio dos anos 80, criado como um
espaço de exibição e discussão entre cineastas. Acredito que graças, novamente
ao digital, e ao valor exorbitante do cinema comercial, os cineclubes
retornaram no meio dos anos 90, mas a maioria com o objetivo de exibir filmes
para as comunidades pobres. Aos poucos as pessoas perceberam que poderiam
realizar suas próprias produções, na maioria em formato de curta-metragem, na
comunidade e exibi-las nos cineclubes.
Este
movimento já está bastante grande e vem crescendo mais a cada dia. Até no
próprio Festival Internacional de Curta Metragem de São Paulo, nos últimos
anos, entrou na programação os “filmes de comunidade”, na mostra online, onde
em 2012 o filme “C´Kost”, produzido no JAMAC, por moradores e alunos, com
quinhentos reais, ganhou como melhor filme na categoria formação do olhar.
Bem,
desculpa, voltando ao “cinema abaixo de 0’. Neste método de produção vale tudo.
Vale convidar a sogra como produtora de alimentos, a mãe como figurante, a
namorada do amigo para ser a mocinha, os salgados do final de festa de 15 anos,
ticket alimentação da irmão, um amigo que trabalha na empresa de manutenção de
poste para emprestar o caminhão para fazer a grua, sobras da escola de samba
para o figurino, perseguir um carro de policia de verdade para a cena de ação,
convidar os Rapers do bairro para fazer a trilha sonora, e no final o vizinho
com o carro equipado de som de funk para exibição do filme na comunidade. Só
não vale empréstimo de banco. Primeiro que não é qualquer um que consegui
dinheiro no banco para realizar um filme no Brasil e segundo que você vai
entrar em um buraco sem volta. O Cinema abaixo de 0 é mais comum do que se
pensa e é praticado no Brasil inteiro, iniciou com curta-metragem e agora tem
vários cineastas produzindo longas.
Faz
quase 12 anos que produzo curtas metragens e parece piada, em 2012 foi a
primeira vez que saímos da categoria “filmes abaixo de 0”, acho que este é o
sonho de todos que ainda estão assim.
Em
breve estaremos lançando dois curtas-metragens. O primeiro em película e com
patrocínio da Lei Rouanet, uma animação de Rodrigo Eba! e do coletivo Grafiti
com Pipoca. O segundo é o “Caixa
d´Água”, minha direção e do Gilberto Caetano, um infanto juvenil, que conta a
história de 4 crianças que brincam na caixa d´água de casa enquanto a mãe sai
para trabalhar. Estaremos enviando mais texto sobre estes filmes logo mais.
Antes
de finalizar, gostaria de divulgar nosso projeto Mascate Cineclube, que desde
2005, circula itinerante pela região da Cidade Ademar/Pedreira exibindo
curtas-metragens e longas nas comunidades. Quem tiver um curta-metragem e
quiser nos enviar fique à vontade. Só não pode ter palavrão porque as pessoas
reclamam. (risos)
Parabenizo
a iniciativa do Rafael e todos que contribuem com o projeto, pois além de ser
um espaço para falarmos sobre nossos trabalhos também é de divulgação,
informativo e de contatos. De todas as entrevistas neste blog a minha preferida
foi com o Esmir filho, sou muito fã dos curtas dele. Acho até (algumas pessoas
vão me matar) que ele foi mais feliz nos curtas do que no longa, o filme “Impar
par”, é um dos mais lindo e completo que já vi na vida.
Thais Scabio.