José
Joffily
Roteirista
Você
trabalhou como co-roteirista no filme A
Filha dos Trapalhões. Como e por quem recebeu
o convite para trabalhar nesse filme? Como foi a experiência?
Já
lá se vão quase trinta anos. Não me lembro de detalhes. Eu tinha cometido um
livro de poemas na época; e a Denise Fontoura, editora do filme, tinha mostrado
um exemplar para eles. Acho que eles gostaram e convidaram-me para mexer nos
diálogos. Fiquei surpreso com o convite; mas, quando meu trabalho começou, as
filmagens já estavam para começar.
O
roteiro de A Filha dos Trapalhões é
baseado no filme O Garoto,
de Charles Chaplin, um dos maiores ídolos do Renato Aragão. Esse roteiro foi
uma forma de homenageá-lo?
Tudo
sugere que seja uma homenagem, mas meu convite era restrito a dar palpites sobre
a estrutura de um roteiro que já existia e escrever novos diálogos.
Você
dividiu o roteiro com o Renato Aragão. Como foi a parceira?
Sequer
encontrei o Renato. Meu contato foi com o Dedé Santana. Foi legal, trabalhei lá
mesmo na produtora. Era engraçado, ficava isolado numa sala; e, de vez em
quando, vinha o Dedé espiar o que eu estava fazendo. Havia uma natural ansiedade,
pois a preparação das filmagens já estava a todo vapor. O Dedé vinha, lia o que
tinha de novidade, balançava a cabeça concordando e saía de novo. Dez minutos
depois, ele voltava. É claro que pouca coisa estava acrescentada, mas ele repetia
as entradas a cada dez ou quinze minutos.
Quais
as recordações que possui desse trabalho?
São
poucas as recordações. Já se passaram quase trinta anos. Trabalho é sempre bem-vindo,
e o povo todo da produção era muito divertido. Assustavam-me um pouco aquelas
mexidas no roteiro em cima da hora. Também sou produtor e sei o transtorno que
alterações de última hora provocam no plano de filmagem. Lembro que o pessoal
da produção também ficava aflito que eu mudasse estruturas, acrescentasse locações,
inventasse novos personagens. Eles também vinham na sala em que eu estava
trancado, perguntavam pelas alterações que já pudessem ir produzindo. Era entre
o engraçado e o aflitivo. Acho que eu talvez achasse graça de nervoso.
Que
representava, naquele período, trabalhar num filme com Os Trapalhões, que
eram certeza de sucesso de bilheteria?
O
filme em si era sempre um sucesso, mas acho que para os colaboradores não trazia
qualquer benefício. Talvez até ao contrário, havia um preconceito bem grande da
classe cinematográfica; e os profissionais que prestavam serviços aos filmes
dos Trapalhões não
eram prestigiados por isso. Mais adiante, as coisas mudaram, quando o Carlos
Manga, o Roberto Farias e o Daniel Filho foram convidados para dirigir os
filmes.
Quais
as suas lembranças do filme A
Filha dos Trapalhões? Onde esse filme foi
filmado?
Não
acompanhei as filmagens, mas lembro que me surpreendia a rapidez com que tudo
era realizado. O filme todo e especificamente o plano de filmagem era desenhado
para atender à agenda do Renato. E foi filmado ali mesmo, perto do estúdio da
R. A. Produções, na Barra da Tijuca (RJ).
Como
Dedé Santana conduziu todo o processo fílmico? Como era a sintonia dele com
Renato, sempre por perto?
Lembro
que me causou certa surpresa o Dedé começar a dirigir os filmes. Acho que foi
somente por uma temporada, uns poucos títulos. Acho que ele não tinha tanto
interesse nesse comando. Antes, tinha o célebre J. B. Tanko, craque que sabia
tudo para conduzir esses gênero de filme. Depois, outros diretores de
reconhecidos talento e competência como o Daniel Filho, o Roberto Farias e o Manga
foram convidados para conferir mais qualidade aos filmes. Acho que foi em
seguida a essa leva que o José Alvarenga Júnior dirigiu muitos títulos e deu também
uma qualidade mais apurada aos filmes.
Na
sua opinião, como Dedé se saiu na direção do filme, já que ele não tinha
experiência na direção?
Acho
que tinha um modelo dentro do qual os filmes funcionavam meio no automático. Acho
que o Dedé não tinha essa ambição de dirigir filmes, acho que talvez ele
estivesse cumprindo uma missão num cargo que estava vacante. Claro que era uma
pessoa de confiança, e isso parecia ser suficiente.
Quais
as lembranças de bastidores do filme? Como foi o seu contato com o quarteto?
Não
acompanhei as filmagens. Assim, tudo que sei foi o que pude perceber daquela salinha
onde fiquei trabalhando. Meu contato com o quarteto não aconteceu, minha interlocução
era com o Dedé e mais algumas pessoas das quais não me lembro.
Quem
era o maior comediante do grupo?
Claro
que o Renato era o líder incontestável. Não sei se todos concordavam com isso,
mas a nossos olhos era o Renato. Os outros eram talentosos e tinham uma comunicação
extraordinária com o público, mas o Renato também era o empresário. Certamente
que o Renato sabia da importância do quarteto e tinha o maior apreço por eles.
Renato
Aragão tem fama de ser perfeccionista. Isso procede? Ele acompanha tudo?
Bem,
acho que ele queria tudo do jeito dele, mas eu não acompanhei o Renato acompanhando...
Acredita
que essa característica de Renato o torna diferente, um profissional de
sucesso?
Eu
diria que a graça e a ingenuidade de sua interpretação somadas ao espírito empresarial
foram os ingredientes do sucesso.
Por
que, na sua visão, os críticos e a Academia rejeitam os filmes produzidos e estrelados
pelos Trapalhões?
Os
filmes faziam sucesso e vendiam muitos ingressos. Acho que isso já indispunha uns
e outros. O humor dos Trapalhões era
bem popular e brasileiro, o que também devia incomodar. Convidando diretores de
prestígio, acho que procuraram construir um prestígio que não tinham junto à
Academia. De fato, os filmes ficaram melhores; mas não sei se isso também pesou
para ser o começo do fim.
Como
classifica o cinema feito pelos Trapalhões?
Um
cinema que não se faz mais. Um tipo de humor que hoje só se encontra nos
circos.
Gostaria
que contasse alguma curiosidade sobre esse filme, já que foi testemunha ocular
desse projeto.
Num daqueles
dias escrevendo dentro da sede da produtora, o diretor de produção veio me
procurar com um retrato da minha caçula Isabel, que tinha acabado de nascer. O
nome e o sobrenome dela estavam escritos no verso do retrato como uma candidata
a ser o bebê personagem do filme. Surpreendido, ele veio tirar a limpo. Quando
perguntei como ele tinha conseguido a foto, soube que a foto tinha sido
encaminhada por uma agência de modelos infantis em Copacabana (RJ). Sabendo da
“roubada”,
eu disse que era um equívoco; e só mais tarde descobri que a sogra/avó coruja
tinha procurado a agência de modelos com a foto da Bel.