Bruno é cineasta. Dirigiu e montou diversos curtas e longas, entre
eles está ‘Encontro das Águas’.
Qual é a importância
histórica que o curta-metragem tem no cinema brasileiro?
O
curta metragem tem importância histórica não só no cinema brasileiro, mas
também na própria história do cinema de maneira geral.
A
sétima arte praticamente nasceu quando os irmãos Lumière exibiram o filme A
CHEGADA DE UM TREM NA ESTAÇÃO, que foi a primeira projeção de um filme ao
público. O filme consistia em uma estação movimentada por pessoas aguardando a
chegada de um trem. Após um tempo o trem surge e vem em direção à câmera. Na
sala de cinema as pessoas começaram a correr e pular as cadeiras, com receio de
que o trem as atropelassem.
Isto
só foi possível no cinema, já que é a única arte capaz de imprimir o tempo como
um evento concreto. Pensando neste filme, é fácil perceber a importância
histórica do curta metragem na história do cinema. Além deste caso, existem
milhares de outros. Luís Buñuel mudou a história do cinema, com seu curta de
aproximadamente 30 minutos, UM CÃO ANDALUZ.
No
brasil não foi diferente. Humberto Mauro fez inúmeros curtas, entre eles o
clássico A VELHA A FIAR. Humberto influenciou uma geração de cineastas e o
Brasil produziu inúmeros curtas de cineastas que no futuro produziram seus
longas e se tornaram grandes diretores.
Por
que os curtas não têm espaço em críticas de jornais e atenção da mídia em
geral?
O espaço para o curta metragem ainda é restrito, mas
tem crescido muito. Hoje existem uma centena de festivais que exibem curtas
metragens no país e com uma boa assessoria de imprensa, o que acaba gerando, de
certa forma, um espaço de divulgação e de discussão a respeito dos curtas
metragens produzidos no país.
Mas o que acontece na verdade é que vivemos em um
país que não tem a cultura de valorizar a exibição de curtas metragens no
cinema e muito menos na televisão. A cultura ela é educada e já que não temos
como assistir os curtas em tevê aberta, acabamos, por consequência, tendo
também uma mídia restrita. O cinema além de ser arte, é mercado e a mídia e as
críticas dos jornais atendem a esse mercado. Como o curta metragem não tem o
espaço que atinge diretamente o público, a mídia em geral acaba dando menos
atenção.
É uma pena, pois o curta metragem é um espaço de
experimentação único e especial dentro do conceito audiovisual.
Na sua
opinião, como deveria ser a exibição dos curtas para atingir mais público?
Acredito que o povo tenha muito interesse em
assistir curtas metragens. O curta pode trabalhar situações que num longa seria
impossível. A estrutura dramática é outra, o tempo, o ritmo, a necessidade de
ser mais sucinto e outras coisas mais. Isso desperta a atenção do público, mas repito: não
temos uma educação cultural que nos favoreça e que habitue o olhar do
espectador para o curta metragem. O ideal seria ter canais de televisão aberta que
exibissem o curta metragem em horários especiais, justamente para habituar o
público, já que a televisão é o meio de comunicação mais direta.
Somente após uma conquista destas seria possível
exibir curtas metragens em salas de cinema antes dos longas metragens ou até
mesmo em sessões especiais.
Pode parecer uma loucura este pensamento, mas com o
tempo a exibição de curtas em tv aberta geraria interesse dos exibidores em
salas de cinema. E para finalizar é importante ressaltar também da
mídia de internet, que hoje em dia é sem dúvida a mais acessada e de uma
importância tremenda. Os espaços de exibições de curtas poderiam ser
maiores na internet. Existem poucos sites que exibem curtas metragens.
É possível ser um cineasta só de curta-metragem? Vemos que o curta é sempre um
trampolim para fazer um longa...
A
maioria dos bons diretores do mundo todo exercitaram suas linguagens e visões
nos curtas metragens antes de se tornarem diretores de longas. O curta não é só
o trampolim para o longa, ele é a verdadeira faculdade de formação do olhar do
diretor cinematográfico. Ele é o espaço onde você pode arriscar para se
descobrir, para saber quem você é realmente e que cara o seu cinema vai
ter.
O
que acontece é que após você formar seu olhar e definir uma linguagem as
necessidades mudam.
O
curta é o formato onde você define seu estilo, mas é no longa metragem que você
encontra o diálogo com o público. Por esse e por outros motivos, na maioria das
vezes, os diretores de curtas se transformam em diretores de longas.
Existe
também a questão da realidade de produção, já que no longa a verba é maior e
condição de trabalho mais propícia. Mas na realidade viver só de curtas
ou não é extremamente pessoal. Conheço diretores no Brasil que fazem curtas há
20 anos e ainda não fizeram longas. Quando pergunto a eles sobre longas
metragens eles não demonstram interesse. São
raras exceções, mas existe.
O
curta-metragem é marginalizado entre os próprios cineastas?
Isso definitivamente eu acredito que não. Os curtas
metragens são apreciados por diretores e produtores no Brasil todo. Em alguns
festivais, às vezes, as sessões de curtas tem mais público que a sessão de
longas. As
grandes produtoras do Brasil produzem curtas e longas, pois o produtor sabe que
o grande diretor nasce fazendo curta metragem.
Pensa em dirigir um curta futuramente? Qual é o seu próximo
projeto?
No momento estou finalizando dois curtas metragens. Um deles
é um documentário de observação poética do ciclo das águas que dirigi em
parceria com o documentarista e amigo Evaldo Mocarzel. O filme se chama
ENCONTRO DAS ÁGUAS e está na reta final da fase de finalização. Além deste
projeto estou com outro curta que dirigi juntamente com o coreógrafo Alessandro
Brandão.
O filme na verdade é um média metragem que também está em
fase de finalização. O projeto se chama PEQUENA PAISAGEM DO MEU JARDIM e é um
filme que une a arte da dança com a arte do cinema. Fora esses dois filmes que
já estão filmados, estou com três projetos de curtas que espero rodar antes de
dirigir um longa metragem.
Os cinco projetos são todos diferentes e com linguagens
distintas. Estou aproveitando o espaço que o curta metragem sugere de experimentação,
para definir minha própria linguagem como diretor.