Texto em que Lucchetti narra
as circunstancias como ocorreram a possibilidade da publicação do seu primeiro
conto.
Na rua
Guaicurús, junto ao ponto que eu utilizava para pegar o bonde que me levaria à
cidade, havia uma gráfica. Enquanto aguardava minha condução, ficava olhando
encantado para as máquinas imprimindo e produzindo um ruído cadenciado que
soava aos meus ouvidos como suave melodia, que embalava meu sonho: imprimir ali
minhas histórias que a essa época já se amontoavam numa das gavetas do
guarda-roupa da família. E durante todo o trajeto de bonde até a cidade, eu
ficava sonhando, vendo meus contos impressos com belas ilustrações, tal como
via nas revistas pulps das quais eu era leitor e colecionador.
Um dia
descobri que naquela gráfica imprimiam um jornalzinho que circulava uma vez por
semana, ‘O Lapiano’. Imediatamente fui atacado de súbita ousadia. Escolhi um
dos contos que me pareceu o melhor, coloquei-o num envelope e mandei meu pai
subscritá-lo. Ele tinha uma caligrafia bonita e eu achava que o envelope
subscritado por ele daria mais crédito.
Na manhã
seguinte, entrei timidamente na pequena gráfica, encaminhei-me até o alambrado
de madeira, atrás da qual, sentado à uma escrivaninha entulhada de papéis,
estava um senhor gordo, rosto redondo, muito vermelho e calvo. Usava uma
viseira presa à testa e as mangas da camisa, ligeiramente erguidas e presas por
elásticos, parecendo com uma liga. Somente muito depois, fiquei sabendo que a
viseira esverdeada era para que a luz que pendia sobre ele não o atrapalhasse
ao revisar as provas tipográficas e que as mangas erguidas era para não sujar
os punhos engomados. De onde ele estava perguntou-me que é que eu queria.
Estendi o braço e me debrucei sobre o alambrado, estendendo-lhe o envelope. E
sem uma palavra fui embora. Naquele dia, não esperei o bonde naquele ponto, na
verdade nunca mais voltei e ele.
E qual não
foi a minha surpresa, quando uma semana mais tarde, vi meu conto impresso. Era
“A Única Testemunha”, calcado nos contos de Edgar Allan Poe, “O Coração
Revelador” e “O Gato Preto” que eu havia lido numa de minhas revistas
policiais.
Ver meu
primeiro trabalho publicado com letra de imprensa, foi uma sensação
indescritível. Com o jornalzinho na mão, fiquei vagando dando voltas pelo
bairro, com uma vontade imensa de dizer a cada transeunte: “Olha, este conto é
meu! Fui eu quem o escreveu”
Meus olhos
estavam banhados de alegria que não conseguia ler além do título.
Momento supremo
da existência onde conseguimos tocar o imponderável. Basta um instante para
conseguimos ter nas mãos a essência da vida, o que muitos não conseguem em toda
uma existência, embora bem sucedidos materialmente.
Era um sonho
impossível que se realizava. Ele aconteceu no longínquo 31 de outubro de 1942,
um sábado. E desde então aprendi que é aos sábados que os milagres ocorrem.