O senhor foi o ator do primeiro seriado filmado em película para
televisão da América Latina. Quais são as suas principais recordações desse
período?
Era um tempo bem difícil, pois ninguém
acreditava numa série brasileira para a TV. Ser pioneiro naquele tempo era uma
grande aventura. Mas deu tudo certo com a força dos colegas e técnicos e o
valioso patrocínio da Nestlé. Desde o início quando fui trabalhar nos Estúdios Maristela, fazendo todo tipo
de serviço (auxiliar de produção, motorista, etc..) minha meta era bem clara:
entrar no mundo do cinema. Quando fui escolhido para o papel, vi meu sonho se
realizar...
Como foi o trabalho como cantor de circo aos 15 anos de idade?
Foi o começo de tudo. No circo tinha um número
de música e também um "teatro" de cena curta. Tudo o que eu mais
queria era estar nesse meio. Como não tinham vaga para ator, disse que cantava
também, e assim entrei no circo como cantor. Foi uma carreira breve, mas era o
início.
Como era o seu dia a dia na Maristela, no bairro do Jaçanã? O que fazia
lá? O senhor trabalhou lá até o seu fechamento?
Eu ia na Maristela levar documentos para o
Alfredo Palácios que era o principal produtor do estúdio, e assim fiz amizade
com ele e com seu assistente Ari Fernandes que seriam no futuro o diretor e
produtor do "Vigilante". Fui ficando por lá até seu fechamento quando levaram os equipamentos para
montar o primeiro estúdio de dublagem de São Paulo, a Gravasom, que
posteriormente seria a AIC na Rua Tibério na Lapa - SP.
“O Vigilante Rodoviário” foi um grande sucesso, o senhor foi escolhido
como protagonista entre mais de 120 candidatos. Como foi essa seleção?
O diretor procurava um tipo bem brasileiro que
se adequasse ao papel. A seleção envolveu atores de teatro e policiais. Vários
candidatos foram testados e quando ele já estava desistindo a D. Inês a esposa
do Ari sugeriu que ele fizesse um teste comigo que já atuava em teatro amador
pelo Teatro Popular do Sesi, e já tinha visto os testes anteriores. Fui escolhido
e deu certo.
O que achou da decisão do
produtor e o diretor da série em transformar cada 4 episódios em um filme longa
metragem e lançar no cinema?
Foi
uma decisão lógica para divulgar o programa, pois havia salas de cinema em
quase todas as cidades do Brasil, ao contrário de tevês que quase não existiam
naquele tempo ( menos de 30% das casas tinham tevê).
Muitos atores hoje famosos começaram suas carreiras participando da
série, entre eles: Rosamaria Murtinho, Fulvio Stefanini, Juca Chaves, Ari
Toledo, Ari Fontoura, Milton Gonçalves, Luiz Guilherme, etc... considera a
série o maior marco da sua trajetória profissional?
Não posso responder por todos, mas acho que a
maioria considera a série do Vigilante uma grande oportunidade que aconteceu em
suas vidas artísticas.
Eles eram iniciantes e a participação numa serie de cinema para tevê era tudo o que eles precisavam para se projetar.
Eles eram iniciantes e a participação numa serie de cinema para tevê era tudo o que eles precisavam para se projetar.
Os atores e postulantes a atores pediam para trabalhar na série ou eram
convidados?
Alguns foram convidados e outros se
prontificavam a trabalhar mesmo sem um bom cachê, para se lançar na TV. Mas
todos sempre acreditaram no projeto.
O senhor sofria que tipo de assédio graças ao sucesso da série?
Foi uma surpresa mesmo. O assédio a princípio
foi mais pelas crianças, mas com o crescente sucesso da serie adultos se
aproximavam e queriam falar e tocar no "Vigilante". Sentiam que tudo
o que transmitíamos era verdade: a ética, os bons exemplos, a divulgação da
nosso cultura, etc...
O inspetor Carlos ficou tão
conhecido que o senhor foi convidado a entrar na Polícia Rodoviária de São
Paulo em 1965, onde ingressou após prestar concurso e cursar a Academia Militar
do Barro Branco. Por que tomou essa decisão?
Minha
opção em continuar o trabalho do personagem foi motivada pela paixão despertada
pelos valores morais, éticos, e que esses valores deveriam ser sempre mostrados
através do trabalho do policial consciente de seu dever em ajudar o próximo.
Muitos críticos consideram a sua decisão de trabalhar na policia como
equivocada, já que o senhor teria enormes possibilidades de seguir na carreira
artística. Hoje, refletindo, considera acertada a sua decisão de trabalhar na
policia?
Infelizmente grande parte da população não
conhece o trabalho da instituição que é a Polícia Militar. Embora minha decisão
de deixar minhas origens de circo, teatro, cinema e TV, possam parecer
conflitantes, para mim parece muito lógico, pois segui minha consciência.
Em 1992, o senhor foi citado no Livro dos Recordes (Guinness Book) como
sendo o único ator a se tornar na realidade, o personagem que havia
interpretado na ficção. Qual é o impacto deste feito na sua vida?
Quando o Ari Fernandes, criador da serie me
informou de nossa citação no Guinness, nos sentimos recompensados pelo
sacrifício de noites mal dormidas, da incompreensão de algumas pessoas, e nos
sentimos realizados e estimulados.
Nunca pensou em atuar em telenovelas?
Quando terminou a série, fui convidado para
atuar na TV, mas nesse tempo eu abri uma produtora de comerciais, e depois de
dois anos entrei para a polícia e daí fiquei sem tempo. Meu trabalho era o de
policial. Participei do filme "Independência ou Morte" com o Tarcísio
Meira, a Glória Menezes, e muitos outros, como diretor de produção e fiz dois papéis
também. Fiz também um longa-metragem "Até o último mercenário", mas
tudo isso nas férias da polícia. Novela seria impossível.
Quais as suas principais recordações do cão Lobo, que morreu em 1971?
Foi o meu melhor companheiro, o animal mais
inteligente que conheci. Ele sabia o que fazer em cena só com um gesto. Até o
Luiz Afonso, seu dono, ficava impressionado com nossa afinidade. Sinto muito
sua falta. Foi meu melhor "colega" de trabalho.
A série teve apenas 38 episódios filmados e dois anos no ar pela TV
Tupi, e TV Cultura, mas é nítida a lembrança por pessoas, até mesmo jovens,
desse trabalho. Na sua opinião, por quais motivos essa série está na memória
afetiva de milhares de pessoas?
É mesmo um fenômeno! Eu acho que a série
remete as pessoas à sua infância, a um tempo que deixou lindas lembranças. Nos
eventos que participo muitas pessoas chegam às lágrimas de emoção quando se
referem ao seu tempo de criança quando esperavam ansiosamente encontrar semanalmente
seu herói da TV. É muito gratificante.
A reprise da série pela Rede Globo em 1976, e recentemente pelo Canal
Brasil em 3 temporadas deu boa repercussão para o senhor? Tem ideia da
audiência? Aumentou ainda mais o número de fãs?
Sem dúvida! Muitos jovens chegam no stand do
Simca nos eventos e dizem que viram a serie na TV junto com seus pais e avós. É
emocionante.
O ‘Vigilante Rodoviário’ pode ser considerado um herói genuinamente
brasileiro?
Sem dúvida! Essa sempre foi nossa intenção e a
repercussão até hoje demonstra que acertamos. Tivemos o cuidado de transmitir
valores, paisagens, cultura e ambientes tipicamente brasileiros.
Há muitos estudos na área de marketing, e publicidade, bem como nas de
sociologia, psicologia e antropologia a respeito do seu trabalho. Os estudantes
ainda te procuram?
Bastante. Dou muitas entrevistas e faço
palestras em faculdades de comunicação, jornalismo, teatro etc...
Foi no Teatro popular do SESI que o senhor atuou na peça “O ídolo das
Meninas” de Gastão Tojeiro. Como foi esse trabalho?
Foi minha primeira atuação no palco. Eu fazia
artes cênicas no Teatro Popular do SESI, a Laurita, diretora de interpretação
no curso e o Vicente Sesso professor de teatro me deram essa chance.
O que o teatro representou na sua carreira?
O teatro é a mãe e o pai das artes cênicas. O
princípio de tudo. Aprendemos a encenar no teatro. O resto vem depois...
Como é o seu dia a dia em Águas da Prata – SP?
Entre uma viagem e outra, recebo fãs,
participo da vida da cidade, visito amigos, etc... uma vida "quase"
normal.... rsrrs
O senhor participa de Encontro de Carros Antigos por todo o país,
resgatando a memória da TV e cinema brasileiros, e também leva a universidades,
escolas, empresas e comemorações cívicas em forma de palestras o trabalho que a
Polícia Militar do Estado de São Paulo desenvolve em prol da população. Fale
sobre essas ações que realiza.
Hoje em dia é minha principal atividade. Acho
que estar sempre ativo preserva a saúde tanto física quanto mental, além da
importância do resgate da memória da TV e cinema. A imagem do
"Vigilante" é importante para esse resgate. Esse trabalho envolve
também participações em festividades cívicas e da polícia.
Para finalizar, gostaria de
saber se nunca teve receio de ser considerado um ator de um trabalho só.
Como
ator, brasileiro que sempre colaborou com seu país, só fiz o que meu coração
pediu sem a preocupação de estrelismo fácil. Acredito que cada um tem o seu
caminho. O meu foi este.