A SECRETÁRIA PERFEITA
R.
F. Lucchetti
–
Stamford, a próxima estação! – Gritou o fiscal do trem, quando o trem deixou a
estação de Darien.
Eram 7h49.
Eram 7h49.
Susan Blair, que embarcara em Bridgeport às 7h15, verificou se dispunha de
quantidade suficiente de lápis com ponta. Colocou sua bolsa sobre o assento do
lado, para garantir um lugar para Hugh J. Waterman, que, às 7h57, embarcaria em
Stamford.
Waterman, diretor da Companhia de Investimentos Waterman, fazia a viagem diária
para Nova York. Era um homem metódico e, ao mesmo tempo, um dínamo humano.
Todas as manhãs fazia ditados, rápidos e resumidos, durante todo o percurso de
Stamford à Rua 125; e repetia a mesma coisa todas as tardes, no trem das 17h2,
que partia de Nova York.
Susan se empregara como sua secretária há alguns meses. Raramente o via em seu
escritório de Nova York. Lá, ela passava a maior parte do tempo digitando o que
ele ditava no trem. Não era um trabalho exaustivo, considerando-se o bom
salário que recebia.
De bloco e lápis prontos, Susan tirou um minuto para maquilar-se. O seu
espelhinho refletia um rosto pequeno e alerta, olhos vivos, um nariz levemente
arrebitado e uma grande mecha solta de cabelos louros. Acertou a pintura dos
lábios.
Waterman era o que se podia chamar um modelo de equilíbrio, sempre preciso e
eficiente.
Eram 7h53, e o trem passou por Glenbrook sem parar. A essa hora, em dezembro, ainda era escuro e as pessoas na plataforma mais pareciam sombras cinzentas.
Eram 7h53, e o trem passou por Glenbrook sem parar. A essa hora, em dezembro, ainda era escuro e as pessoas na plataforma mais pareciam sombras cinzentas.
Dentro do carro, as luzes ainda estavam acesas. Os passageiros que embarcaram
em Bridgeport, Norwalk e Darien já tinham se acomodado confortavelmente. O
inevitável jogo de bridge já fora organizado. Viajavam corretores, comerciantes
e editores. Susan viu o jovem Phil Dodds, mais à frente , lendo um programa de
corridas de cavalo. Dodds era um dos sócios da Cia. Waterman; e Susan não o
tinha em boa conta, porque, embora sendo um homem casado, era visto
freqüentemente almoçando com moças do escritório.
Bem defronte, sentava-se o “antipático”. Ela assim o chamava porque
todas as manhãs ele escolhia um lugar defronte ao dela ou o mais perto
possível.
Ele era um tipo sombrio e melancólico, que jamais dirigia uma palavra ou um olhar
a Susan. Ficava sempre alheio a tudo, até o momento em que Waterman embarcava
em Stamford, quando, então, se tornava muito atencioso, não com a moça, mas com
o próprio Waterman. Susan Blair era uma observadora incomum. Gostava de
classificar as pessoas; e, para ela, o “antipático” era um caçador de
informações sobre o mercado de títulos, sempre tentando ouvir o que ditava o
perito em investimentos Hugh J. Waterman.
O fiscal do trem pediu a passagem do “antipático”.
– Bom-dia, Conkling.
O fiscal conhecia todos os passageiros pelo nome ou de vista. Tomou, depois, a
passagem do passageiro do banco de trás de Susan, mas sem o cumprimentar pelo
nome.
Susan olhou por cima do ombro, para ver o estranho. Era um jovem a quem nunca
vira naquele trem. Usava um distintivo de desligamento do Exército na lapela do
paletó esporte, e as calças eram das que usam os oficiais. Susan deduziu três
coisas: que ele era de boa aparência, inteligente e se achava concentrado, não
em si, mas no homem que se sentara no banco defronte:
Conkling.
– Stamford! – Gritou o fiscal.
Susan voltou-se para a janela, com grande ansiedade, preparando-se para
apreciar o espetáculo apresentado por Waterman tomando o trem. Comumente era
uma cena que oferecia momentos de emoção. E, naquela manhã, tornou a acontecer
a mesma coisa. Muitos passageiros aguardavam o trem na plataforma, menos
Waterman. O seu carro não se achava entre os outros lá estacionados. O fiscal
já ia dar o sinal de partida... e nada de Waterman.
O
trem reiniciou a marcha. Foi aí que começou o espetáculo. Um sedã chegou
correndo à estação. A esposa de Waterman vinha ao volante, agasalhada com um
casaco de peles. Susan viu quando ela se despediu de Waterman com um beijo na
face; e, então, ele saltou do carro com sua pasta, disparando em direção ao
trem. Waterman tinha quarenta anos e pesava quase cem quilos, mas isto não o
impedia de correr como um colegial todas as manhãs, exatamente às 7h57, para
alcançar o trem. Na manhã escura e fria, com a plataforma cheia de neve, o
espetáculo ofereceu emoções mais fortes do que nunca.
Não obstante, num abrir e fechar de olhos como de costume, Waterman agarrou o
balaústre do último carro e pulou. Susan respirou aliviada. Temia que um dia
ele quebrasse o pescoço. Chegou ofegante, vermelho e apressado. Despiu o
casaco, dobrou-o cuidadosamente e colocou-o sobre o bagageiro.
– Bom-dia, Susan – cumprimentou bruscamente, sentando-se ao lado da jovem.
Dirigiu-lhe seu costumeiro sorriso, abriu a pasta e tirou um grande maço de
correspondência.
– Responda a estas afirmativamente – e ia passando-lhe algumas cartas. – A
estas, negativamente... Mande a essas pessoas as cotações que pedem... Aqui
está uma carta cuja resposta merece um tratamento especial. Inicie-a assim:
“Caro Senador, com referência aos títulos da Companhia Cord...”
Durante vinte minutos, ele mais parecia uma metralhadora. O lápis de Susan
voava sobre o papel.
– Aqui está uma carta de McCoy & Blake, de Chicago: Responda pessoalmente
para Bill McCoy, assim: “Caro Bill, compre de qualquer maneira ações da
Companhia Fairfax. E não se esqueça da reunião no 18º andar.”
Susan estremeceu ligeiramente. Waterman devia estar enganado, pois ainda no dia anterior havia aconselhado a um de seus clientes que vendesse as ações da Fairfax. Na verdade, o próprio Waterman havia vendido todo o seu estoque daquelas ações. Por que iria aconselhar um amigo como McCoy a comprar tais ações?
Susan estremeceu ligeiramente. Waterman devia estar enganado, pois ainda no dia anterior havia aconselhado a um de seus clientes que vendesse as ações da Fairfax. Na verdade, o próprio Waterman havia vendido todo o seu estoque daquelas ações. Por que iria aconselhar um amigo como McCoy a comprar tais ações?
Susan olhou intrigada para seu patrão. Mais adiante, pôde ver Conkling bastante
inclinado, com o intuito aparente de escutar o que era ditado. Na opinião de
Susan, Waterman havia notado o interesse daquele homem em ouvi-lo; e isso o
deixara nervoso. Eis aí a razão de ele haver empregado o verbo errado. Ou não seria isso? Susan sabia que Waterman era um homem astuto. Jamais
cometera um erro. Talvez estivesse propositadamente despistando Conkling.
Susan relanceou o olhar sobre o ombro. O jovem de paletó esporte ainda fixava
Conkling. Havia um certo ar de desconfiança em seu rosto.
O trem passou por New Rochelle.
Waterman ditou mais meia dúzia de cartas. Quando chegaram à Rua 125, ele fechou
a pasta e disse:
– Por hoje é só, Susan.
Foi a primeira pausa para ela. Olhou em torno. As luzes do trem, mais fortes
agora que ele entrava no túnel, revelaram a Susan uma leve marca de batom na
face de seu patrão. Isso a deixou um tanto embaraçada, pois sabia que devia
avisá-lo. No entanto, estava indecisa. Waterman considerava-se perfeito em tudo
e talvez se aborrecesse, caso lhe chamasse a atenção para aquilo. Mas o senso
do dever fez com que ela mudasse de ideia.
– Sr. Waterman, espero que não se aborreça, por eu dizer isto. Quando sua
esposa o beijou, na estação, deixou uma marca de batom no seu rosto.
– Obrigado, Susan. – O financista mais parecia grato do que aborrecido. Tentou
tirar a marca do rosto; porém, não conseguia acertar o local.
A moça sorriu.
– Deixe que eu limpo.
Com seu lenço, Susan, de uma só vez, fez desaparecer a mancha vermelha.
– Grand Central! – Avisou o fiscal.
Eram 8h46.
Ao
sair da estação, Susan notou que o rapaz de paletó esporte seguia Conkling.
Waterman percebeu seu olhar enigmático e explicou:
– Chama-se Scudder. Contratei-o para vigiar aquele tipo.
Susan ficou surpresa.
– O senhor se refere ao homem que senta em frente ao nosso banco? Ele é
perigoso?
Waterman, apressando-se em direção a um táxi, deu um sorriso irônico.
– Espero que não; mas acontece que há três dias andaram vasculhando as gavetas
da minha escrivaninha, na minha casa em Stamford. Pode muito bem ser o homem
que senta defronte a nós e fica à escuta, todas as manhãs. Por isso,
encarreguei Scudder de descobrir tudo.
Vinte
minutos depois, Susan estava escrevendo cartas. Digitou primeiro a carta para
McCoy e levou-a ao escritório de Waterman.
– Isto aqui não está errado? – E apontou para a palavra compre.
– Sim, está errado – respondeu-lhe Waterman, com ar de surpresa, o que fez
Susan concluir que o erro não fora cometido deliberadamente.
– Eu queria dizer venda. Pode corrigir.
– Outra coisa. Ontem, o senhor me pediu que eu não o deixasse esquecer que hoje
é o seu aniversário de casamento.
– Exatamente. – Fechou os olhos, como se estivesse pensando em alguma coisa.
Depois, disse bruscamente: – Telefone para a Joalheria Atlee. Diga que vou
ficar com o broche de esmeralda que me mostraram no outro dia.
Peça que o
embrulhem para presente e mandem para cá.
– Sim, senhor.
Susan sentou-se em sua mesa e fez o telefonema. Devia ser agradável ter um
marido tão generoso, pensou ela. Do mesmo modo, devia ser muito bom ter uma
esposa tão devotada como a sra. Waterman. Só mesmo uma esposa amorosa, concluiu
Susan, levaria seu marido até a estação todas as manhãs às 7h57 e lá o
esperaria à tarde, às 17h52.
Susan terminou o seu trabalho. Gastou apenas meia hora no lanche. Eram quatorze
horas, quando Waterman pediu que lhe trouxesse uma determinada pasta.
– Mande Phil Dodds aqui.
Mas Susan não encontrou o jovem sócio. Dodds havia saído para falar com alguns
clientes e ainda não tinha voltado.
Pouco depois das dezesseis horas, Susan levou um maço de cartas para Waterman
assinar. Esperava que ele terminasse as assinaturas, quando o rapaz de paletó
esporte e distintivo do Exército entrou.
– Olá, Scudder – saudou Waterman. – Esta é minha secretária, a srta. Blair.
Estou muito ocupado agora. Faça o seu relatório a ela.
Susan encaminhou-se para a sua sala; e Scudder começou a falar, assim que ela
se sentou à escrivaninha:
– O relatório resume-se no seguinte: o sr. Conkling tem um álibi perfeito para
a noite em que vasculharam as gavetas da escrivaninha do sr. Waterman. Foi
outra pessoa, menos Conkling. Ele é um sujeito inofensivo. Sua culpa começa e
termina no trem, por ouvir o que o sr. Waterman dita.
Susan anotava o que o rapaz dizia, quando foi interrompida pela campainha do
telefone. Atendeu ao telefone e ouviu uma voz áspera:
– Aqui é o chefe de polícia de Stamford. Quero falar com o sr. Waterman.
Como de hábito, Susan respondeu:
– Ele está ocupado, no momento. É muito importante?
A voz do outro lado foi agressiva:
– Claro que é importante! A esposa do sr. Waterman foi assassinada.
O choque de tais palavras petrificou-a. Ainda confusa, fez a ligação e ouviu a
voz de Waterman:
– Aqui fala Waterman.
Desligou o telefone e olhou para Scudder, gaguejando:
– É a polícia! Disseram que ela foi assassinada!
– Ela quem? – Indagou Scudder, ansioso.
– A sra. Waterman.
Daí a um minuto, Waterman entrou na sala. Estava pálido.
– Vou para casa – a voz saía com dificuldade. Pegou o sobretudo e correu para o
elevador.
Horrorizada com tudo aquilo, Susan ficou muda. Scudder pegou o telefone e falou
asperamente:
– Alô, telefonista! Quero falar com a delegacia de polícia de Stamford. – Olhou
para Susan e explicou: – Talvez não passe de um truque para afastá-lo daqui. Ou
talvez haja relação com o caso que estou investigando. – A ligação foi feita, e
Susan ouviu-o dizer: – É o chefe de polícia de Stamford?... Meu nome é Scudder,
trabalho para o sr. Waterman... Um assaltante?... Os papéis de sua escrivaninha
espalhados?... Obrigado.
– Que sabe eles? – Perguntou Susan ansiosa, quando Scudder repôs o fone no
gancho.
– A esposa de Waterman levou-o à estação às 7h57. Umas doze pessoas a viram
voltar para casa sozinha. O carro está na garagem. Hoje é quinta-feira, dia de
folga da empregada. Uma vizinha, ao visitá-la esta tarde, encontrou-a
estrangulada junto à escrivaninha. Estava morta há sete ou oito horas. Deve ter
surpreendido o assaltante, ao voltar da estação. Qual o horário do próximo
trem?
– 17h2 – o mesmo em que vou para casa todos os dias.
Mecanicamente, Susan começou a juntar as suas coisas. Tinha deixado sua bolsa
em algum lugar. Entrou no escritório de Waterman e achou a bolsa sobre a
escrivaninha.
– Também vou nesse trem – disse Scudder.
Tomaram um táxi para a Grand Central e chegaram lá às 16h55. Waterman aguardava
impacientemente que se abrisse o portão da plataforma.
– É melhor não incomodar – disse Susan. – Nada podemos fazer por ele. Pobre
homem!
Permaneceram afastados, no meio da multidão; e, quando o portão se abriu,
Waterman foi um dos primeiros a passar. Não o viram mais até se sentarem no
trem. Waterman estava no terceiro banco adiante.
– Este é um de meus primeiros casos – disse Scudder, em tom melancólico. – E
sinto que fracassei.
– Como assim? – Indagou Susan, sem entender.
– Por não ter apanhado o homem que entrou na residência de Waterman há três
noites. Se eu o tivesse prendido, a sra. Waterman estaria viva.
– Você é detetive há bastante tempo?
– Não. Quando servi o Exército, fiz parte do Serviço Secreto. Gostava do meu
trabalho. Por isso, ao dar baixa, há um mês, achei que poderia fazer o mesmo
tipo de serviço na vida civil.
Susan quase não o ouvia. Seus olhos e pensamentos estavam voltados para
Waterman...
“Estaria Conkling naquele trem?” Perguntou a moça a si mesma.
Bem, isso não tinha importância, pois ele não poderia estar em Stamford, logo
depois que o trem deixara a estação naquela manhã. Nem ele, nem ela, nem Phil
Dodds, nem Scudder, nem qualquer outra pessoa que viajara naquele trem. O crime
fora cometido logo após a sra. Waterman voltar da estação.
– Conhecia a sra. Waterman pessoalmente? – Indagou Scudder.
Susan balançou a cabeça.
– Eu a via, naturalmente, duas vezes por dia, na estação. Na semana passada, eu
a vi no escritório. Veio almoçar com o marido. Ela sorriu para mim...
Susan interrompeu a narrativa nesse ponto, notando um movimento estranho de
Waterman: viu o homem abrir a janela ao lado do banco onde estava sentado e
arremessar alguma coisa para fora.
O estranho, no gesto de Waterman, foi ela ter reconhecido o objeto jogado fora.
Mas não podia ser! O objeto era dela e estava na bolsa, ainda há pouco!
Para certificar-se, abriu a bolsa e procurou. Não estava mais!
Susan Blair sentiu um calafrio percorrer seu corpo da cabeça aos pés. Um
pensamento invadiu sua mente, como um raio... As conclusões que tirava pareciam
todas coincidir. Até mesmo a contratação de Scudder para vigiar Conkling. E
aquele sorriso gracioso da sra. Waterman, na semana passada, no escritório! Um
tipo de mulher grande, robusta, quase masculina!
À medida que o trem avançava, os pensamentos de Susan eram invadidos pelos
fatos. Tudo coincidindo. As gavetas da escrivaninha de Waterman vasculhadas...
Aquele caríssimo broche de esmeralda, o erro no ditado da manhã! E aquele
objeto que deveria estar em sua bolsa, mas que, ao invés disso, foi jogado fora
por Waterman!
Agora estava certa de tudo. Um senso de realidade a fez ficar calada diante de
Scudder. A noção de responsabilidade, porém, exigia que ela falasse. Scudder,
além de tudo, era um detetive criterioso. Voltando-se para Susan, ele
perguntou:
– Que aconteceu? Você parece estar vendo fantasmas. Posso ajudar em alguma
coisa?
– Sim. Você poderá me dizer se estou errada.
– Errada em quê?
– Em pensar que o assassino da sra. Waterman é o próprio marido.
– Claro que você está errada! – Respondeu Scudder. – Ela o levou à estação hoje
de manhã. Eu a vi; e cinqüenta outras pessoas também a viram, inclusive você!
– Diariamente, durante anos, cinqüenta pessoas têm visto aquela mulher levar o
marido à estação – concordou Susan. – Todos apreciam, ainda, a ginástica que
faz o sr. Waterman para apanhar o trem. E foi o que novamente aconteceu na
manhã fria e escura de hoje. Eu mesma a vi. Mas noventa e nove por cento de
minha atenção se concentravam no sr. Waterman, a fim de ver se ele
conseguia pegar o trem; e apenas um por cento olhou para a sua esposa, uma
mulher enrolada em agasalhos, de xale na cabeça e vista através do vidro
molhado do para-brisa.
Os olhos de Scudder brilharam
– Vamos! Continue!
– O sr. Waterman pode muito bem ter inventado essa história de haverem
vasculhado as gavetas de sua escrivaninha. Isso justificaria o emprego de você
para vigiar Conkling e daria a impressão de que suspeitava de alguém
interessado em informações sobre o mercado de títulos. Você, portanto, seria
mais uma testemunha a jurar que viu sua esposa levá-lo de automóvel à estação.
Susan esperou por um instante que Scudder discordasse de suas suposições. Mas ele apenas disse, ansioso:
Susan esperou por um instante que Scudder discordasse de suas suposições. Mas ele apenas disse, ansioso:
– Continue. O detetive agora é você, não eu.
– Então, quando ela o beijou, ao despedir-se na estação, deixou no rosto dele a marca de batom. Limpei-a com o lenço. Mais tarde, ele se lembrou desse detalhe e tirou de minha bolsa o lenço manchado que acaba de jogar pela janela.
– Só isso? – Indagou Scudder.
– Sua esposa não usava batom, no dia em que eu a vi no escritório. E a mulher que o trouxe à estação usava.
Scudder refletiu por um momento. Waterman poderia ter assassinado sua esposa às 7h40, antes de sair de casa; e, mesmo que outra mulher o tivesse levado à estação, cinquenta pessoas jurariam que era sua esposa.
– Prove-me que estou enganada – implorou Susan.
– A prova está nos lábios da mulher assassinada – disse Scudder, sacudindo negativamente a cabeça. – Se não houver batom, Waterman é o assassino. Aquele beijo o traiu.
Scudder levantou-se de seu lugar.
– Aonde vai? – Perguntou Susan, com voz fraca.
– Dizer a Waterman que sei quem é o assassino.
Scudder avançou três bancos adiante.
Susan viu quando Waterman voltou-se e encarou Scudder.
A secretária notou o medo que se estampou nos olhos de seu patrão, quando o ex-militar sentou a seu lado.
Nesse instante, a porta do carro se abriu e o fiscal gritou com voz forte:
– Stamford, a próxima estação!