quinta-feira, 1 de março de 2018

Os Trapalhões: Oswaldo Lioi


Oswaldo Lioi
Cenógrafo


Gostaria de saber como e em que circunstâncias surgiu o primeiro convite para trabalhar com o grupo.
Eu já tinha um encantamento pelo cinema, enquanto era aluno de Anísio Medeiros, grande diretor de arte de Macunaíma, Dona Flor e Seus Dois Maridos, Lição de Amor etc.). Eu cursava Arquitetura e Cenografia; e ele foi o meu grande incentivador, fazendo a apresentação da primera exposição que fiz como artista plástico pela Funarte. Em seguida, depois de experimentar o Super-8 e Animação; conheci Tizuka Yamasaki na Cal, onde fizemos um clipe. E ela me indicou para Yurika Yamasaki, com quem tive o primeiro contato com longas (o Leila Diniz). E Yurika logo me convocou para o primeiro filme assinando.

Você trabalhou em diversas produções do grupo. É um dos poucos profissionais que possui longa parceria com o quarteto. Quais foram os filmes que mais o marcaram e por quê?
Com certeza, o primeiro: Os Fantasmas Trapalhões. Dirigido por um ícone do cinema brasileiro, J. B. Tanko, esse filme é um delicioso projeto, que ainda tem Zezé Macedo. Destaco também O Casamento dos Trapalhões e Os Trapalhões e a Luz Azul. Esses dois filmes marcaram pela complexidade das construções em estúdio: como a cidade tomada de neons e cores; e no Luz Azul, a grande caverna e a cidade cenográfica, possíveis com imensa pesquisa material e de soluções nascidas e desenvolvidas ali.

A que se deve essa longa trajetória com Os Trapalhões?
Vejo pelo gosto de trabalhos com e para crianças... E também pela longa parceria com Yurika Yamasaki.

Renato Aragão tem como cartacterística o perfeccionismo no seu trabalho. Ele acompanha todos os detalhes do filme. Como foi trabalhar com ele?
Sempre um prazer. Nada se compara a trabalhar com e para alguém que sabe como ninguém aonde quer chegar. Daí, a longevidade.

Como foi a sua relação de convivência com os quatro atores, durante os períodos de filmagem?
Inesquecíveis. Cada qual com seus personagens, eternos clowns... bem brasileiros e adoráveis, numa relação de extremo profissionalismo, seriamente palhaços.

Muito se fala que havia ciúmes entre Os Trapalhões. Chegou a detectar isso?
Não vejo dessa forma. O grupo cresceu. Chegaram a fazer filmes separados; mas voltaram a ficar juntos, depois. Sobrou a dupla Didi e Dedé, e os que se foram não puderam ser substituídos à altura.

Como era a convivência com a equipe (técnicos, atores etc.) fora do set de filmagem?
Bastante profissional na relação, como quaisquer atores/técnicos. O Mussum talvez fosse bem mais anárquico dentro e fora. Total harmonia.

Você mantinha contato com eles, após os trabalhos? Fez amizade com algum deles?
Normalmente, mesmo reencontrando fora, mantinha uma distância. Acho importante preservar esse espaço profissional.

Por que os críticos e a Academia rejeitam os filmes produzidos e estrelados pelos Trapalhões?
Pelo mesmo motivo pelo qual, durante muito tempo, esses filmes e, em geral, todos aqueles feitos no Brasil para crianças, serem desconsiderados pelos festivais ou considerados descartáveis ou menores: preconceito tolo. E lembro bem de ter dificuldades nos anos 1980 de tirar o registro profissional no sindicato, por ter trabalhado em três filmes dos Trapalhões...

Como classifica o cinema feito pelos Trapalhões?
Tenho o maior carinho por esse tipo de cinema. É um cinema único, do anti-herói- atrapalhado. Uma fatia difícil de se preencher com a frequência que tínhamos. Hoje, o mercado americano continua preenchendo a lacuna.

Qual o legado histórico que o cinema dos Trapalhões deixou para o país?
Acho bem difícil imaginar cinema no Brasil sem a Comédia, sem Mazzaropi, sem Zezé Macedo, sem Dercy Gonçalves, sem Didi Mocó e Dedé. Seria como não ter Macunaíma. Eles ainda são nossos maiores clowns. Sem eles, essa história não seria completa.

Podemos considerar Renato Aragão um dos maiores e melhores produtores de cinema do país?
É ainda a maior longevidade de produção para criança, talvez única na frequência que teve. Difícil repetir essa saga.

Os Trapalhões sempre “brincaram” em parodiar filmes e clássicos estrangeiros de sucesso para o cinema. Que pensa a respeito dessa linha que eles seguiram?
A paródia aos clássicos é uma maneira deliciosa de fazer rir, sem medo, e não só no cinema. Em Barcelona, existe um Museu Picasso. Lá há somente pinturas de Pablo Picasso, parodiando os quadros clássicos e dos amigos, uma verdadeira aula de bom humor.