domingo, 30 de novembro de 2008

Kiko Goifman

O cineasta Kiko Goifman é um dos mais criativos da sua geração e também um dos mais prolíficos.

Está lançando agora o filme "Filmefobia". 


Qual é a importância histórica que o curta-metragem tem no cinema brasileiro?
Acho que o curta é importante historicamente e também hoje, no Brasil. Muitos curtas foram fundamentais para a cinematografia brasileira. Entre vários que poderiam ser citados, sempre será destacado “Ilha das Flores”, que ainda hoje é um dos filmes favoritos em sites no Brasil e no exterior. O curta brasileiro está presente em diversos festivais importantíssimos na Europa e, assim como o longa, representa de forma significativa o país.

Você acha que dá para contar uma história em tão pouco tempo de metragem?
Claro que sim. Tanto em ficções como em documentários, que também podem ter formato curto ou longo. Muitas vezes, alguns longas poderiam ter ficado bem mais interessantes se os diretores tivessem optado por fazer um curta.

Por que os curtas não tem espaço em críticas de jornais e atenção da mídia em geral?
Isso não é só uma questão brasileira. Diferentemente da literatura, em que um conto pode ser extremamente respeitado, existe uma hierarquia estabelecida no cinema na qual o longa sempre é mais importante do que o curta. Em grandes festivais que não se dedicam somente aos curtas eles são vistos com menos importância do que os longas. Forma-se um círculo: os curtas também possuem dificuldade de exibição, isso inibe a mídia, o que acaba gerando menor espaço. Mas os festivais de curtas estão cada vez mais fortes, o que é muito bom.

Na sua opinião, como deveria ser a exibição dos curtas para atingir mais público?
Tenho dúvidas quanto à obrigatoriedade de exibição antes dos longas. Na verdade, quando digo que tenho dúvidas, são dúvidas mesmo, não quer dizer que eu seja contra essa obrigatoriedade. A dúvida principal é que tendo a não gostar de obrigatoriedades em geral, por outro lado, isso na atividade cinematográfica (mecanismos de proteção, incentivos etc.) é fundamental. Talvez um bom exemplo relativo a público no Brasil seja o Curta Cinema, no Rio de Janeiro, que acabou de acontecer. Ele aumentou quase 300% seu público esse ano por ser totalmente gratuito. Ou seja, o público quer ver.

É possível ser um cineasta só de curta-metragem? Vemos que o curta é sempre um trampolim para fazer um longa...
Sim, é possível. Com certeza. Não acredito nesta de trampolim. Um curta deve ser encarado como uma obra em si, de curta duração.

Pensa em dirigir um curta futuramente?
Eu dirijo longas e curtas, alternadamente. Não acho que depois que fiz meu primeiro longa agora eu só deva dirigir longas. Acho isso uma bobagem. Adoro fazer curtas e continuarei fazendo sempre.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Remier Lion

Remier é pesquisador e autor do livro ‘O Mestre do Terrir’, biografia de Ivan Cardoso.

Qual é a importância histórica que o curta-metragem tem no cinema brasileiro?
O cinema (no Brasil e no mundo) nasceu de curta-metragem., demorou até que filmes com metragem maior que 10 minutos se tornassem um padrão. Muitas pessoas hoje pensam e falam do "curta-metragem" como se ele fosse um determinado "gênero cinematográfico", repetindo outro equívoco muito comum que é pensar e falar de "cinema brasileiro" também como um "gênero cinematográfico". As razões que levam alguém a fazer um filme curto são sempre, em primeiro lugar, econômicas (quer dizer, técnicas), em segundo lugar, políticas e, em último lugar, de linguagem. Num contexto histórico brasileiro, essa entidade chamada "curta-metragem" é só um mito ingênuo explorado por aproveitadores. E não vejo problema nenhum nos "aproveitadores", pois cinema é "arte" para quem sabe tirar partido das oportunidades, minha implicância são com certos "mitos" gerados pela ignorância e alimentados por determinados segmentos que procuram monopolizar o sentido das coisas. O cinema brasileiro (e o filme de curta-metragem realizado nesse contexto) ainda carece de uma história lúcida e madura.

Por que os curtas não tem espaço em críticas de jornais e atenção da mídia em geral?
Vamos separar as coisas: a crítica cinematográfica de jornal é totalmente (des)orientada por interesses econômicos bastante restritivos, significa muito pouco. A que é praticada como hobby, e postada na internet, é só um hobby. Agora, quando você fala que o curta não merece "atenção da mídia em geral", fico em dúvida. Te pergunto: o que é "mídia em geral" pra você? Senso comum? Hora, estamos vivendo numa sociedade cada vez mais "audiovisual" e existe um boom de produções no formato curto – estimulada, entre outras coisas, principalmente pela internet, que, por mil razões, precisa de muito volume de informação (inclusive narrativas audiovisuais) formatada em pílulas...

É possível ser um cineasta só de curta-metragem? Vemos que o curta é sempre um trampolim para fazer um longa...
É possível, claro. Temos grandes exemplos de que tamanho não é documento... Quanto a essa mentalidade de que o curta é um trampolim para o longa, isso é uma questão particular de cada um, orientada por interesses sociais, econômicos, "de classe", digamos. Não merece muita atenção. Quem é, é.

Qual é o seu próximo projeto?
Publicar o resultado de minhas pesquisas sobre cinema brasileiro popular, vai chamar "Malditos Filmes Brasileiros"!

domingo, 23 de novembro de 2008

Vladimir Modesto

Vladimir Modesto é um dos fundadores do Cine Favela. Já produziu e dirigiu vários curtas, alguns deles estão no YouTube!

Como surgiu a idéia do Cine Favela?
O Cine Favela surgiu quando exibimos o filme (Uma Gota de Sangue) na praça dentro da comunidade e os moradores adoraram a idéia de ver um filme com cenas gravadas na favela e com atores moradores, isso nos motivou a criar o projeto.

Vocês fazem anualmente o prêmio ‘Prêmio Cine Favela de Curta Metragem’. Como anda a produção de curtas em Heliópolis e locais semelhantes à comunidade?
O Premio Cine Favela de Curta Metragem e' feito uma vez por ano para promover e valorizar os novos cineastas e principalmente as produções periféricas.

Há bons curtas sendo produzidos?
As produções de curta metragem tem crescido a cada dia, pois as oficinas de cinema realizadas pelo Cine Favela tem despertado os jovens. Os trabalhos que estão sendo produzidos são de bom conteúdo e vejo que poderão ficar melhor com o passar do tempo.

Os curtas que vocês produzem sempre estão relacionados com as temáticas da comunidade. Pensam em filmar uma comédia, por exemplo? Ou sempre farão curtas que retratem a realidade de Heliópolis?
O Cine Favela nasceu da indignação de nós moradores, então acredito que os temas sempre serão os problemas sociais e suas mazelas (estamos vivendo tempos de lágrimas), por isso acredito em temas críticos, precisamos gritar que somos gente que merecemos viver dignamente.

Quais as dificuldades que encontram ao filmar?
As dificuldades foram muitas, pois os equipamentos de filmagem e luz eram emprestados, essa foi nossa maior dificuldade e claro por não ter apoio financeiro.

É verdade que o traveling é um carrinho de supermercado?
O nosso travelling foi realmente um velho carrinho de supermercado, pois não tínhamos verba para alugar esses acessórios, sempre quis fazer cenas criativas.

Acredita que a atriz Victoria Abril deu visibilidade ao projeto Cine Favela quando decidiu fazer uma ponta no longa-metragem de vocês?
A participação da atriz Victoria Abril nos deu maior visibilidade e mostrou que nosso projeto é forte e que somos capazes, após esse episodio veio também o apresentador de TV Otavio Mesquita que se ofereceu em participar do longa.

Pensa em gravar um curta futuramente? Qual é o seu próximo projeto?
Meu próximo projeto ainda esta sendo elaborado, mas com certeza o tema será critico (romance e comedia deixo com os estúdios Hollywood). Como cineasta eu adoro longa-metragem, produzir curta-metragem eu prefiro deixar para os nossos alunos das oficinas, pois sonho ver nossos jovens expor suas idéias e reclamações através do cinema.

(Victoria Abril em cena)

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Antonio Carlos da Fontoura


Antonio Carlos da Fontoura é diretor, produtor, roteirista e professor de cinema. Estreou na direção de longas-metragens com Copacabana me engana, um sucesso de bilheteria, ganhador do prêmio de melhor roteiro no Festival de Brasília.

Qual é a importância histórica que o curta-metragem tem no cinema brasileiro?
O curta revelou alguns de nossos mais importantes cineastas, tais como Glauber Rocha, Joaquim Pedro de Andrade, Leon Hirzman e muitos outros.

É possível ser um cineasta só de curta-metragem? Vemos que o curta é sempre um trampolim para fazer um longa.
Acredito que nem todos os cineastas de curtas pretendam dirigir longas, mas muitos deles acabam fazendo isto como uma evolução natural.

O curta-metragem é marginalizado entre os próprios cineastas?
De forma alguma. Todo cineasta adora ver um bom curta.

Como é trabalhar com a síntese no curta-metragem?
É uma simples questão de adequar o tema ao tempo disponível.

Na sua opinião, como deveria ser a exibição dos curtas para atingir mais público?
Nos anos 60 a exibição dos curtas era um complemento obrigatório da exibição dos longas estrangeiros, mas o sistema foi desvirtuado pelo mercado, levando ao fim da obrigatoriedade, mas hoje quem vai ao cinema é obrigado a assistir dezenas de comerciais e de trailers. Voltar de alguma forma a institucionalizar o curta como complemento seria a solução.

Por que os curtas não tem espaço em críticas de jornais e atenção da mídia em geral?
Atualmente os curtas estão confinados nos festivais, onde disputam o espaço da mídia com os longas nacionais.

O senhor, ao longo da sua brilhante carreira, fez mais curtas do que longas. Qual é a razão? O curta é mais viável?
Eu fiz a maioria dos meus curtas nos anos 60 e no início dos anos 70, quando os curtas tinham retorno comercial. Meu primeiro longa, por exemplo, foi produzido em boa parte com recursos provenientes da venda de curtas.

Conte como foi filmar "Wanda Pimentel", seu processo de criação, produção e direção.
Wanda Pmentel foi um filme encomendado pelo então galerista Vitor Arruda. A partir dos quadros e das instalações da artista penetrei na solidão feminina, me utilizando apenas de imagens e ruídos, sem narrações ou depoimentos. Um filme experimental, a meu ver muito bem sucedido.

Conte como foi filmar "Ver Ouvir", seu processo de criação, produção e direção.
Realizado em 1966, nasceu do choque que tive ao me deparar numa exposição na Galeria G4 em Copacabana com o trabalho de três jovens artistas, Roberto Magalhães, Antonio Dias e Rubens Gerchman, simplesmente devastadores na visualidade com que em seus trabalhos transmutavam a cacofonia da cidade contemporânea. Realizei o filme com o diretor de fotografia David Zingg e o montador Mário Carneiro.

Conte como foi filmar "Ouro Preto & Scliar", seu processo de criação, produção e direção.
Neste pequeno e preciso filme fui guiado pelo pintor Carlos Scliar numa visita afetiva à cidade onde ele instalou seu atelier de inverno, Ouro Preto, fonte de inspiração de grande parte de seu trabalho. O filme foi financiado pelo próprio Scliar, que queria um registro de sua relação com a cidade histórica.

Conte como foi filmar "Meu nome é Gal", seu processo de criação, produção e direção.
Gal consiste de três canções interpretadas pela cantora, "Saudosismo", "Divino Maravilhoso" e "Meu Nome é Gal", na verdade três clipes pioneiros, que dirigi com produção de David Neves e de André Midani, então diretor da Philips.

Conte como foi filmar "O último homem", seu processo de criação, produção e direção.
Alfred Bester, Robert Schekley e Arthur Clarke, três grandes mestres da literatura de ficção científica, travaram contato neste filme com o planeta Rio de Janeiro por ocasião do único congresso internacional de science-fiction já promovido no Brasil, nesta cidade, pelo saudoso José Sanz. Contei no filme com a preciosa colaboração do Antonio Calmon e de Carlos Vergara, que criou a bela introdução do filme.

Conte como foi filmar "Chorinhos e Chorões", seu processo de criação, produção e direção.
Fruto de meus encontros boêmios com Lúcio Rangel, que conheci como trombonista virtual nas rodas de chope do bar Zeppelin e depois descobri ser um brilhante estudioso de nossa música popular, quando me guiou nesta viagem às raízes da mais sofisticada música instrumental brasileira. O filme foi realizado graças ao apoio do Departamento do Dilme Cultira, do INC.

Conte como foi filmar "Heitor dos Prazeres", seu processo de criação, produção e direção.
Meu primeiro trabalho como diretor de cinema registrou de forma muito carinhosa o poético esforço do nobre pintor e sambista popular, em 1965, para se manter fiel à imagem de uma cidade que só sobrevivia em sua arte e seus sonhos. Uma produção artesanal, fotografada por Afonso Beato e montada por Rui Guerra, que realizei graças ao apoio do diplomata Arnaldo Carrilho, então no setor cultural do Itamarati.

Conte como foi filmar "O Rapto das Cebolinhas", seu processo de criação, produção e direção.
Meu único curta-metragem ficcional foi fruto de minha amizade por Maria Clara Machado, que me deixou adaptar uma de suas mais divertidas peças infantis para realizar um filme em meu sítio encantado na região de Nova Friburgo, agora eternizado pela magia do cinema. Usei atores e talentos artísticos locais e o filme foi produzido com recursos do projeto Curta Criança, do Ministério da Cultura.

Conte como foi filmar "Os Mutantes", seu processo de criação, produção e direção.
Com a ajuda do Antonio Calmon persegui com a câmera sempre em movimento uma brincadeira mutante improvisada por Arnaldo Dias, Sérgio Batista e Rita Lee, num dia único pelas ruas de São Paulo. A produção também foi do David Neves e do André Midani.

Conte como foi filmar "Arquitetura de Morar", seu processo de criação, produção e direção.
Guiado pelo mestre José Zanine, empreendi uma viagem lírica à três maravilhosas casas erguidas por ele na encosta à beira-mar da Joatinga, ostentando com muita honra uma deslumbrante trilha musical especialmente criada para o filme pelo maestro Antonio Carlos Jobim.

Pensa em dirigir um curta futuramente? Qual é o seu próximo projeto?
Meu próximo projeto é o longa 'Somos Tão Jovens", sobre a transformação de Renato Manfredini Junior em Renato Russo, em Brasília, entre 1976 e 1982. Quanto a novos curtas, tenha em pauta uma adpatação do livro infantil "Faca Sem Ponta, Galinha Sem Pé", de Ruth Rocha, pendente de aprovação pelo projeto Curta Criança.

domingo, 16 de novembro de 2008

Alberto Guzik

Crítico, ator e teórico. Guzik é um sensível observador da vida teatral onde exerce longa e profícua carreira nos órgãos de imprensa e nos palcos.

Qual é a sua relação com os curtas?
Os curtas são a forma mais experimental do cinema, o formato em são encontradas propostas desafiadoras e ousadas. Por ser um formato mais barato e acessível, por ser instrumento de trabalho de muitos cursos de cinema, deparamos nos curtas um veículo ideal para a busca e a pesquisa de linguagens, para a expressão de conceitos e visões de mundo as mais variadas. Mas não é justo considerar o curta como apenas um instrumento de aprendizado ou uma porta para o cinema de longa-metragem. É preciso reconhecer também o curta, seja ficcional ou documentário, enquanto obra de arte autônoma.

O que te faz aceitar, como ator, um convite para atuar em curta-metragem?
A vontade de participar desse jogo, uma aventura breve, mas fascinante. E o resultado final me surpreendeu pela criatividade, pela invenção, pela brincadeira com a linguagem elaborada pelos jovens realizadores do curta em que atuei. Gostei muito do resultado. E estou disponível para outras experiências.

O senhor também escreve para teatro que, geralmente, possui texto longo. Se fosse convidado para escrever um roteiro para curta, acha que seria desafiador trabalhar com a síntese?
Na verdade já trabalho com a síntese no teatro. A linguagem ficcional extensa é a do romance. A dramaturgia, para teatro ou cinema, em textos longos ou breves, exige síntese. Não há espaço para descrições. Há que narrar através de imagens ou ações ou diálogos. Só isso. Então, como é extremamente desafiador escrever textos teatrais, tenho certeza de que será igualmente desafiador escrever roteiros para curtas. Gostaria muito de experimentar isso.

Pensa em dirigir um curta futuramente?
Acredito que sim. Mas antes de dirigir um curta, precisaria atuar em mais curtas, para entender melhor a prática dessa linguagem, pois até hoje minha relação com os curtas foi a do espectador. Agora é que estou começando a sacar as leis e os princípios em que essa forma de narrativa se apóia.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Jorge Furtado


Jorge Furtado é um dos fundadores da Casa de Cinema de Porto Alegre, da qual é integrante até hoje. No período de vigência da Lei do Curta, alcançou grande sucesso de público e crítica com os filmes ‘O dia em que Dorival encarou a guarda’ , ‘Barbosa’ e, principalmente, ‘Ilha das Flores’ , com os quais recebeu vários prêmios nacionais e internacionais.

Qual é a importância histórica que o curta-metragem tem no cinema brasileiro?
O cinema nasceu curta, os primeiros filmes são curtas, no Brasil também. Sempre produzimos grandes curtas, Humberto Mauro (muitos), Linduarte Noronha (Aruanda), Joaquim Pedro (Couro de Gato), Glauber (Pátio e Di), muitos cineastas fizeram grandes filmes de curta duração. O cinema é uma das poucas formas de expressão em que o valor é julgado pelo tamanho, ninguém diria que Jackson Pollock é um pintor maior que Paul Klee porque seus quadros são maiores, ou que os contos de Borges são literatura menor que James Ellroy. Em arte, tamanho não é documento.

É possível ser um cineasta só de curta-metragem? Vemos que o curta é sempre um trampolim para fazer um longa...
É impossível viver (isto é, sobreviver, ganhar dinheiro) fazendo só curtas, mas também não é fácil viver de longas, se é que é possível viver de longas. Por mim, sigo fazendo curtas e longas. E programas de televisão. E sites.

Como é trabalhar com a síntese no curta-metragem?
É um desafio interessante. Em síntese.

Como é o processo de elaboração de um roteiro para curta-metragem? Nos curtas é possível inovar na escrita? Vemos que os longas sempre tem a mesma amarração. É isso?
Acredito que cada roteiro é um caso diferente, não há regras claras, felizmente. Documentários, ficções realistas, filmes-ensaio, filmes-poema, cada um pede um tipo de roteiro. Curtas podem, em tese, ousar mais na linguagem, arriscar mais, já que ninguém vai sair de casa para ver um curta, curta é quase uma surpresa, um brinde.

Na sua opinião, como deveria ser a exibição dos curtas para atingir mais público?
Todos os canais são importantes: tela de cinema, tevê, internet, DVD, tudo o que existe e que ainda vai ser inventado. Quanto mais mídias, melhor.

Por que a ‘Lei do Curta’ não vingou? Qual é o legado que ela deixou?
A "Lei do Curta" durou um bom tempo, fez surgir uma geração de cineastas, mas caducou por mau uso ou por má gestão. Parte do público não gostava de dar de cara com um inesperado curta brasileiro antes do longa, e alguns filmes eram chatos mesmo.

O senhor é um dos fundadores Casa de Cinema de Porto Alegre, da qual é integrante até hoje. Como e pra que surgiu essa idéia?
Surgiu em 1988 com a idéia de juntar forças, reunir num espaço uma turma que já trabalhava junto, em cinema ou tevê, pessoas com a idéia comum de fazer cinema e televisão e continuar morando aqui. Funcionou, até agora.

‘Ilha das Flores’ é uma referencia para todos os cineastas e espectadores de curtas. Seu filme sempre é citado nas entrevistas. Quando o senhor filmou ‘Ilha das Flores’ pensou na magia que estava fazendo? Como lida com o sucesso deste curta?
Quando vi o filme pela primeira vez, numa projeção acelerada (provavelmente a 26 quadros) no antigo cinema Vitória, fiquei chocado. Achei que era impossível alguém prestar atenção naquilo por tanto tempo, 15 minutos de texto, centenas de imagens de todos os tipos. Na segunda projeção (24 quadros, enfim) no Festival de Gramado, percebi mais claramente o impacto do filme. Gosto do filme até hoje, acompanho projeções com freqüência (pelo menos uma por ano, há 19 anos) e sempre descubro coisas novas no filme. A locução do Paulo José é comovente.

Depois de ‘Ilha das Flores’ ficou mais “difícil” fazer curtas, tamanho o parâmetro que criou?
Não, segue tão difícil como sempre foi.

Após construir uma carreira com os curtas, o senhor decidiu ir para os longas. Quais são as dores e as delicias de dirigir um longa?
Muitas dores (conseguir dinheiro, agendar equipe e atores, arrumar sala para mostrar o filme, convencer o público a sair de casa e ir vê-lo) e muitas delícias (o convívio com a equipe e atores, a montagem, a sala cheia vendo o filme, gente que, anos depois, lembra das cenas e conta os diálogos). E muitas outras que eu não me lembro.

Pensa em dirigir um curta futuramente?
Sim. Depois que comecei a fazer longas já fiz dois curtas, “Oscar Boz” e “Rummikub”. E espero fazer outros, em breve.

domingo, 9 de novembro de 2008

Grace Gianoukas

Grace Gianoukas é a cabeça por trás do bem-sucedido Terça Insana – um pot-pourri de tipos caricaturais que se alternam no palco em divertidíssimos esquetes – a cada mês, o espetáculo muda, conforme uma temática diferente. Os personagens são criados pelos intérpretes ou são fruto de criação coletiva do elenco.

Na sua opinião, como deveria ser a exibição dos curtas para atingir mais público?
Acho que antes de cada longa estrangeiro exibido no cinema tem que passar um curta nacional, e antes de cada longa brasileiro tem que passar um curta estrangeiro....

As TVs abertas e fechadas deveriam ser obrigadas por lei à passar filmes nacionais. Já pensou se na Globo tivesse uma madrugada por quinzena dedicada à exibição de curtas, da meia noite às 6 da manhã? Projetos como o "Curta na Praça" deveriam se proliferar. Imitam tantas coisas originais... porque não imitam isso?

Você já atuou em curtas, como o ‘Flores ímpares’, como se dá a escolha para participar destes projetos?
Atuei em apenas 3 curtas, minha escolha se dá à partir de um convite e da avaliação do roteiro.

O que te motiva, mesmo sabendo que o curta é um gênero underground dentro do cinema, a participar destas produções?
Eu adoro tudo que é original e que tem conteúdo, geralmente isso está no underground, por isso prefiro as produções alternativas. Sinceramente, você acha que eu participaria de um filme da Xuxa ou do Didi?

Como é o processo de preparação, como atriz, para curta-metragem? Dá para se aprofundar na pesquisa da personagem mesmo sabendo que terá poucas falas e aparições?
Qualquer trabalho merece dedicação total, um ator deve se preparar profundamente tanto pra um monólogo de 2 horas quanto pra uma figuração sem fala.

A piada geralmente é curta, vocês humoristas precisam ter um poder de síntese para comprimir a idéia e passá-la ao público ao transmitir a mensagem. Isso é um facilitador para atuar em curtas?
Eu não sou humorista, sou atriz. A atuação, em primeiro lugar, tem a ver com atitude. Seja drama ou comédia, longa ou curta tudo começa e finda na atitude do ator diante da situação que está interpretando.

Pensa em dirigir um curta-metragem futuramente?
Penso em atuar num roteiro meu sob direção do Marat Decartes e da Paula Cohen, com produção da Fuleragem Filmes....Dirigir cinema ainda não é pro meu bico.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Alexandre Lydia


Alexandre Lydia é um dos fundadores do 'Cactos Intactos', guerrilha cultural que promete esquentar os mornos debates sobre cinema e o fazer cinematográfico.

Esta entrevista é uma prova disso.

Qual é a importância histórica que o curta-metragem tem no cinema brasileiro?
Estou longe de ser um historiador do cinema, mas me parece um erro encarar os curtas como longas encabulados ou atrofiados. Acredito na especificidade estética do formato, a despeito da sua patente inviabilidade comercial. Ou talvez até por causa disso. O fato de ser uma não-mercadoria aproxima o universo dos curtas do universo da poesia e talvez da música erudita. Não respeito cineastas que desprezam o curta em nome de uma duvidosa profissionalização do ofício, isto só prova que eles estão subordinados a uma lógica burguesa pautada precipuamente pelo ganho material e a repercussão midiática. O curta-metragem consiste em uma formidável ferramenta de guerrilha cultural, assim como o spam na internet e a nova música engajada independente.

Por que os curtas não tem espaço em críticas de jornais e atenção da mídia em geral?
Os curtas só terão este espaço nos meios de comunicação quando tiverem espaço para exibição e veiculação. Além disso, para artistas verdadeiros importa muito menos ser badalado e incensado pela imprensa do que ter chance de mostrar o seu trabalho. Penso que este tipo de filme deveria ser exibido gratuitamente em telões ao ar livre. Os curta-metragistas seriam remunerados de forma compatível ou subsidiados para produzir. O cinema não pode se tornar um lazer de elite. Senão todo filhinho de papai entediado com o play station 3, vai pedir de aniversário uma câmera de alta definição e uma ilha de edição digital para tirar onda de artista e circular pelos festivais exibindo suas roupinhas da moda, penteados estapafúrdios e tatuagens do Che Guevara. Na verdade, isto já acontece em parte.

É possível ser um cineasta só de curta-metragem? Vemos que o curta é sempre um trampolim para fazer um longa...
O curta nem sempre é um trampolim para fazer um longa, até porque fazer um longa com essas leis de incentivo à cultura vigentes está ficando cada dia mais complicado e proibitivo, para não dizer inexeqüível. O Cinédrio (com c mesmo) é uma realidade inescapável no Brasil. Você precisa se tornar uma figurinha carimbada para ser respeitado como cineasta. Se o seu filme não tem atores de tv, nem você é enturmado com as panelinhas que vicejam em torno das estrelas globais e celebridades passageiras, vai ter que se contentar com uma semaninha em cartaz com as salas vazias e críticas anódinas que ninguém lê, só você. Isto quando consegue fazer o filme, o que já é uma verdadeira façanha nos dias que correm. Ou se arrastam.

O curta-metragem é marginalizado entre os próprios cineastas?
O curta metragem é marginalizado pelo sistema. O mesmo acontece com a poesia e, em menor escala, com o teatro. Não existe verdadeira arte que não seja marginal, essa é que é a verdade. Foi absorvido, cooptado, incorporado não é mais arte, é outra coisa: entretenimento, diversão, alienação, propaganda disfarçada. Menos arte.

Como e pra que surgiu a idéia de criar o 'Cactos Intactos'?
O Cactos Intactos tinha tudo para ser um coletivo anarquista de cultura, mas na prática acabou convertido em um pseudônimo meu. Mas é e sempre será um grupo de guerrilha cultural, mesmo que esteja se tornando gradativamente uma espécie de bloco do eu sozinho. Concordo com Gilles Deleuze e Felix Guattari, os criadores da esquizo-análise. Para eles, somos todos grupelhos. O conceito de unidade psicológica ou a noção de identidade cartorial sempre me pareceram absolutamente questionáveis.

Minha intenção era também desviar o foco compulsivo que o mundo artístico dispensa às individualidades singulares. Fazer cinema como se faz música em uma banda foi uma das idéias que me inspirou. Pode parecer ingênuo e realmente é porque sempre vai haver um arrivista ou um aproveitador a fim de tirar partido de iniciativas como esta. Eu mesmo estou sendo agora alvo da desfaçatez e do oportunismo de um antigo colaborador do grupo, cujo fracasso subiu-lhe à cabeça. Por conta disso, contra a minha vontade, comecei a assinar os meus curtas como um diretor convencional. Para me prevenir do assédio de espertalhões inescrupulosos. Tem de tudo neste mundo. Até amigos de mais de 25 anos dispostos a aplicar golpes baixos e rasteiras traiçoeiras em quem se meter a besta bancando o anarquista romântico ou o poeta nefelibata. Cuidado!

Vocês já produziram mais de 20 curtas, qual é o legado que vocês pretendem deixar no cinema?
Produzimos 20 curtas em dois anos, 2005 e 2006, no decurso de uma espécie de maratona, que constituiu para mim, pelo menos, um curso prático e autodidata de cinema. Eu sempre fui roteirista, inclusive premiado em Gramado, mas nunca havia dirigido filmes. Esses primeiros vinte curtas estão enfeixados no álbum duplo em dvd Kyne-Makyna. Há um inegável componente diletante que nós assimilamos do “do it yourself” punk. Transplantar este estandarte punk e anarquista da música para o audiovisual talvez seja o principal diferencial do Cactos Intactos em relação a outros grupos que militam e militaram na área. Por favor, não nos chamem de Produtora porque isto representaria um insulto para nós. Nosso livro A Hora do Spam ou O Email é a Mensagem, na iminência de ser lançado, desenvolve minuciosamente todas essas teses e conjecturas a respeito do cinema e da cultura em geral.

Como é feita a escolha para fazer curtas? Vocês já homenagearam a Helena Ignês e o Glauber Rocha... por aí temos uma pista?
Produzimos curtas dos mais variados gêneros, metade documentais, metade fictícios. Homenageamos Glauber em Glauberama, um poema audiovisual. Helena Ignez protagonizou uma obra de ficção (Helena Ignez, Mulher de Sonhos) e é uma das principais entrevistadas no documentário sobre a obra de Rogério Sganzerla, "A Verdade Não é Tudo". 

O tema dos filmes surge aleatoriamente, ao sabor do meu processo criativo como roteirista e cineasta. Sempre foi assim, mesmo na época em que ainda nos empenhávamos, em vão, para viabilizar a utopia da criação coletiva. A grande virada se processou por intermédio da constatação filosófica de que, no fundo, somos plurais, versáteis, ecléticos e multifacetados. Desta forma, logrei manter a atmosfera vibrante de um grupo, ainda que operando de uma perspectiva autoral, o que pode ser visto como paradoxal, mas é apenas dialético.

Atualmente vocês estão preparando um longa metragem. Quais as dores e as delicias de partir para este desafio?
"Papai Doidão" será a primeira comédia psicodélica da história do cinema brasileiro, segundo o insuspeito Neville D´Almeida, cineasta com quem aliás fizemos um doc chamado Dogneville. Parafraseando Lírio Ferreira, será o Ácido Movie. Se Cidade de Deus e Meu Nome Não é Jonhnny são obras elaboradas do ponto de vista dos traficantes e Tropa de Elite, do ponto de vista da polícia, Papai Doidão será o primeiro filme a representar o último vértice do triângulo, o enfoque dos usuários contumazes de substâncias psicoativas, depreciativamente conhecidos como viciados. Será provavelmente o filme mais transgressivo e irreverente de que já se teve notícias. Quem viver verá e quem morrer, reviverá para ver.

Pensa em dirigir um curta futuramente?
Nossos 3 últimos curtas, ainda inéditos serão exibidos sem cortes em um coquetel na cinemateca da Livraria da Travessa do Shopping Leblon, em data ainda a ser definida até o final do ano. São eles: 1) Além da Lenda (abordagem documental do grandioso espetáculo - em ambos os sentidos - de 27 horas de duração sobre a guerra de Canudos, encenado por José Celso Martinez Corrêa em 2007, a partir do romance Os Sertões de Euclides da Cunha. 2) Animais Domésticos (Curta-metragem digital de ficção em HD, no qual dois irmão compartilham o amor de uma mesma mulher em moldura visual retrô-atemporal.) e 3) O Primata Poliglota (outra curta de ficção em HD com Antônio Calloni e Luciana Vendramini, em fase de finalização).

domingo, 2 de novembro de 2008

Rodolfo Nanni

Rodolfo Nanni dirigiu dois longas-metragens: o clássico O Saci (1953), e a primeira adaptação infantil de Monteiro Lobato, Cordélia (1971), co-produção da última fase da Vera Cruz com Lilian Lemmertz e prosseguiu em diversos curtas-metragens e documentários (como Avenida Paulista, premiado pela Embrafilme de 1977).

Nanni fundou os primeiros cursos de cinema. Após um longo período devotado ao ensino universitário, o diretor lançou o filme "O retorno", que foi pensado como uma espécie de contribuição social ao debate da fome e da miséria no Nordeste.

Qual é a importância histórica que o curta-metragem tem no cinema brasileiro?
Não sei se há uma importância histórica, tudo depende dos temas escolhidos e da qualidade do filme. Até poderá ter uma importância cultural.

É possível ser um cineasta só de curta-metragem? Vemos que o curta é sempre um trampolim para fazer um longa...
É claro que é possível e é um fato de que quem faz curtas, quer fazer longas...

Na sua opinião, como deveria ser a exibição dos curtas para atingir mais público?
Já houve, creio que pela Embrafilme, obrigatoriedade de exibição de curtas nas sessões normais dos cinemas. Os curtametragistas deveriam lutar para conseguir isso.

O curta-metragem é marginalizado entre os próprios cineastas?
Então estariam marginalizando suas origens. Mas há, inclusive, um preconceito em relações a documentários de longa metragem.

Qual é o seu próximo projeto cinematográfico?
Um filme de ficção com título provisório de "Cidade Ilimitada".