Atriz, produtora e diretora de cinema, Aurora Duarte, já integrava a Associação de Cinegrafistas Amadores do Brasil, realizou o documentário ‘A Sereia e o Mar’, do qual foi diretora e dona do papel principal. Era o começo de sua carreira de atriz.
Aurora, eu gostaria que você explicasse a sua trajetória no cinema, como que começou a sua carreira e tudo mais.
Numa conversa com a Maria Della Costa, a gente chegou à conclusão que a história de todos os artistas são muito parecidas, são quase iguais. Então quando eu era bem nova eu brincava com os pedaços de filme “Paixão de Cristo” que eu era louca pela “Paixão de Cristo”, fazendo aqueles projetores. Depois, por coincidência, eu ainda era adolescente, eu conheci um francês que fazia filmagem para a Walt Disney, filmava pássaros, e eu comecei a ajudar na produção. Depois eu entrei, ainda adolescente, na associação de cinegrafista amadores do Brasil e fiz um filme, o meu primeiro filme se chamava “A Sereia e o Mar”, eu obviamente era a sereia, e fui a diretora, roteirista e fotógrafa desse filme. Isso me deu popularidade devido a minha idade, eu tinha 13 para 14 anos quando comecei a ter essas experiências, e também a publicar coisas em jornal sobre poesias, eu faço poesia dos 13 anos até agora. Eu tenho dois livros publicados.
Quando o Cavalcanti chegou a Recife, foi uma coisa natural que me levassem até ele, e eu queria trabalhar na produção, sempre tive mania de trabalhar por trás, e o Cavalcante achou muita graça por causa da minha juventude, e eu comecei a ajudar a ver os locais. Então essa experiência para mim, foi de uma importância muito grande, porque meu começo foi com um mestre que nós aqui não respeitávamos, mas eu vi lá fora como era. Trabalhei com o Cavalcanti entre preparação e filmagem mais de um ano. Depois eu vi Cavalcanti ser presidente do festival de Cannes e vi o publico todo aplaudindo ele em pé. Então meu começo foi com um mestre ultrajado aqui porque o que se falava de Cavalcanti era que ele era homossexual, e eu tive que responder muitas vezes essa pergunta em muitas entrevistas, mas na verdade é que ele é homossexual, e que eu dizia: é, mas não é só isso. Então eu explicava para muita gente que não sabia. Agora eu quero dizer o seguinte, eu também não sabia quem era Cavalcanti até eu sair do Brasil, porque daqui a lembrança era de um cara que não tinha tido uma experiência que não foi muito boa na Vera Cruz, e que era homossexual, que era uma coisa secundária, ele era um homem de uma classe incrível, e isso era uma coisa irrelevante. E depois eu tive com ele em vários festivais internacionais. Ele vivia muito na Itália, e todas as vezes que eu estive na Itália, eu estava com ele. Este começo ele foi muito importante, foi o fundador do documentário na escola de documentário Inglesa, dai eu ter ficado como documentarista até hoje, apesar de ter ingressado como atriz, modelo, tudo, até cantei, mas eu me considero uma documentarista.
Pouca gente conhece sua faceta com o curta-metragem. Gostaria que você contasse como foi seu trabalho com o curta. Você gosta desse trabalho, como que é?
Eu comecei a fazer um trabalho sobre folclore, então eu fiz 18 documentários sobre folclore, esses documentários foram para vários países, e eu viajei muito. Era candomblé maracatu, eu levava esses documentários para fora. Ai a minha vida como atriz começou, mas eu nunca liguei, esporadicamente eu voltava e fazia documentário. Mas o que eu acho importante na minha formação, foram as pessoas que tiveram influência na minha vida. Porque eu saí da influencia de homem como o Cavalcanti e fiz 6 filmes com o Carlos Coimbra que era um diretor que não tinha cultura, e eu tinha que ensinar coisas elementares para ele de filosofia, de vida, de história, e ele ao mesmo tempo sendo o grande técnico, porque ele era um grande montador. Ele tinha essa coisa de técnica de cinema, que ele prestava tanta atenção, que é um conto que eu me debato muito, e que nós brasileiros, nós ainda não entendemos, nós cineastas, que o cinema é uma arte baseada numa técnica, não adianta você ter uma grande idéia, se você não sabe realizar tecnicamente. Então você vê, eu faço muitas restrições a muitos filmes, porque eles não disseram direito a que vieram por causa da técnica.
Futuramente a senhora pensa em filmar um curta-metragem?
O curta-metragem eu passei a fazer, eu fiz sobretudo o que eu tinha vontade. Eu fiz um documentário sobre Dantas mortas, sobre poesia, território do Poeta Emílio, fiz um documentário que eu me orgulho muito sobre a faculdade de direito Lar São Francisco, fiz um trabalho sobre a Revolução de 32 que todo ano passa ai pelas televisões e que foi um estudo que eu fiz muito grande, eu fiz um trabalho sobre alcoolismo, que eu fiquei muito tempo fazendo, porque eu sempre tive curiosidade, porque eu conheço tanta gente que bebe. Eu achei que eu tinha uma missão, e eu comecei a fazer uma pesquisa sobre alcoolismo. Esse filme foi considerado de utilidade pública e ficou e exibição durante 10 anos. Eu tenho projetos de documentários, mas no presente momento eu estou muito ligada, não é que tenho por encerrada a parte folclórica, mas eu sou muito por tema, e no momento eu estou muito interessada em história de assombração. No Brasil inteiro você tem histórias incríveis, por exemplo, o “Contos da Lua Vaga” que é um filme japonês que eu adoro, é uma história em preto e branco que tem paranormalidade e que tem uma história em Pernambuco muito parecida com aquela. Eu estou muito voltada no presente momento não a fazer documentário puro, mas a fazer uma coisa mais lúdica, porque o documentário eu já fiz bastante, agora vamos botar um pouco mais de mistério.
E o curta que a senhora gravou, gostaria que a senhora contasse um pouco da história desse curta-metragem?
Um dos documentários que eu acho que é mais interessante que eu fiz foi esse do alcoolismo deu mais satisfação, é claro, até hoje todo mundo fala porque eu fiz um painel sobre o problema do alcoolismo, como é que você faz os diversos caminhos para a cura. Mas eu gosto muito desses documentários da pesquisa, porque você acaba se apaixonando. A revolução de 32, eu fiquei 2 anos lendo sobre a revolução até fazer o filme, claro que fazendo outras coisas. Mas eu tenho filmes, por exemplo eu tenho um chamado “Porta para o Mistério” que é sobre aquelas escritas, que os desenhos estão comendo as letras. Aquele filme, eu já não era criança quando eu fiz, e eu subi aquelas montanhas com uma equipe onde ninguém tinha mais de 30 anos, então a equipe muitas vezes queria que eu ficasse em baixo que era perigoso, mas eu quis fazer. E aqueles buracos, eu fiz um trabalho, que é claro que o que o público viu, o que passou no cinema, que era de 10 minutos, que era da lei. Mas eu guardei esse material, e eu ainda pretendo colocar nessas coisas de mistério, porque eu filmei São Tomé das letras inteiro, que é um lugar muito cinematográfico, muito lúdico, muito interessante.
Eu gostaria que a senhora fizesse um comentário sobre essa nova geração de cineastas. Você vem uma geração que foi vitoriosa, que até hoje é referência no cinema nacional. Como a senhora enxerga esse pessoal que está surgindo , você acha que ainda tem essa integração dos cineastas de um tempo atrás que ainda estão atuando com os novos, você acha que ainda tem que aprender, ou você acha que não vai geração como a sua no cinema nacional?
Eu acho que existe uma distância muito grande, eu tenho contato com cineastas jovens, mas você depois que fica com certo conceito, as pessoas ficam com certo receito de fazer alguma coisa. Então eu não comungo realmente com a nova geração, mas eu tenho contato. E eu acho que nós estamos entrando, porque na minha geração, eu faço muita critica a falta de técnica dos filmes, poucos filmes eu considero bem realizados tecnicamente, acho que muitos ficaram no meio do caminho. Por exemplo, eu adoro “A hora da Estrela” da Suzana Amaral, acho um filme perfeito, porque é uma bela história e está muito bem focado. Agora desses mais recentes, aquele filme do Bavis onde ele filma São Paulo, como eu gostaria de filmar. Então eu gosto muito do filme, porque ele se apropriou da coisa que tem o cinema, que é a sua técnica, e ele conseguiu para mim, admirável, gosto muito do filme dele. Gosto do “O Cheiro do Ralo”, agora eu continuo fazendo muita restrição ao cinema brasileiro, sabe por quê? Nós não conseguimos conquistar o nosso publico, nós temos hoje bons financiamentos, mas a realidade é que o público ainda não está lá.
Existe todo um trabalho, existe um filme que eu gosto muito “O homem que copiava”, porque aquela coisa moral, aquela coisa o bandido se dá mal, eu acho ótimo, porque fica uma coisa mais real do que um bandido se dá bem, mas é um filme, mas muita gente não tem o filme visto como deveria ser. Nós temos ai uma mentirosa visão do que é o cinema atual, mentira, porque o público não está indo ver. Tem um filme meu, não vou falar da “morte do Cangaço”, porque é um filme que ficou 20 anos em exibição, mas vamos dizer, é um filme que ficou duas semanas, deu muito mais expectadores do que muitos lançamentos atuais em um mês dois meses, três meses. Eu acho que no presente momento, estamos encontrando um caminho certo, começamos a nos apoiar na técnica para usar a nossa linguagem. Como você prescrever você tem que saber a gramática, finalmente o cineasta de hoje ele sabe que tem que ele tem que conhecer os planos, agentes, e que mesmo que ele não vá colocar a lente, eu tenho que saber o que eu quero. Nessa parte eu acho que é uma grande vitória, mas eu acho que nós ainda não temos uma identidade. Essa é a realidade, não temos uma identidade do cinema brasileiro.