Eldorado: Um longo caminho para as telas
Em parceria com o Núcleo de Cinema de Ribeirão Preto, Rubens Lucchetti escreveu um ambicioso roteiro, que há mais de vinte anos não consegue ser concluído.
Valter Martins de Paula
Rubens Francisco Lucchetti, na época em que morou em Ribeirão Preto, nunca parou de escrever roteiros cinematográficos. Sua investida mais alta em uma produção deu-se na década de 80, quando, em parceira com o produtor (e hoje diretor do Núcleo de Cinema da cidade) Edgard de Castro, escreveu o que seria a base para as filmagens de “Eldorado: a saga do café,” filme que teria no comando o talentoso diretor Bruno Barreto. Edgard lembra que Rubens, pacientemente, quis contar uma história repleta de referências e que tivesse como fundo a ascensão e a queda da famosa “época de ouro” da região, que teve fim com a quebra da bolsa de valores de Nova Iorque, no final da década de 20.
O filme tinha previsão de lançamento (e data de estréia marcada) há exatos vinte anos. Este foi um desejo, que, por falta de recursos monetários, não pôde ser concluído com êxito. Edgard tenta, agora com a adesão dos estúdios Kaiser, reaver este projeto perdido e filmar a história de uma bailarina francesa que chega ao Brasil e começa a trabalhar em um cassino na cidade de Ribeirão Preto (o que dá título ao filme), até se apaixonar por um roço barão e ter seu casamento marcado bem no dia da quebra da bolsa de valores.
Amizade Profunda
Edgard de Castro sempre foi amigo íntimo de Rubens Lucchetti, na época em que o escritor trabalhou em parceria com grandes nomes da cidade de Ribeirão Preto, como Bassano Vacarini e Tony Miyasaka. Os trabalhos desenvolvidos por eles ganharam prêmios internacionais e fizeram com que seus nomes entrassem no “mapa de reconhecimento” da cidade.
“Eu sempre tive uma profunda admiração e grande respeito por Rubens Lucchetti. Ele é um poeta do cinema, um sujeito maravilhoso que sempre dedicou sua vida aos livros e ao cinema”.
Para Edgard de Castro, Lucchetti é uma pessoa solitária. Ele precisa usufruir desta condição para poder organizar seus pensamentos, suas idéias. “Aqui em Ribeirão as coisas sempre foram muito agitadas para ele. Jardinópolis foi a cidade ideal para a mudança, pois ele está no meio de seus livros e em nenhum momento é incomodado por barulho ou pessoas inconvenientes”.
O Núcleo de Cinema de Ribeirão Preto abrirá um espaço em seus novos estúdios que homenageará Lucchetti. A sala terá o nome do escritor, pois, segundo Edgard, eles sempre trabalharam resgatando nomes consagrados proeminentes da cidade que estão esquecidos. Homenagens tardam, mas não falham.
LUCCHETTI PINTOR
Ivani Rosa
Rubens Francisco Lucchetti interessou-se pelas artes ainda criança. Aos 7 anos, fazia cópia de desenhos que via nos jornais. Com papel de embrulho, Lucchetti construía estradas de ferro e trens, que ornamentavam a sua casa.
Aos 9 anos, Lucchetti já pintava o personagem Genésio Arruda, humorista caipira, que atuava em rádio, circo e alegrava diferentes platéias. Isso deixava seu pai orgulhoso. “Certa vez, meu pai levou-me à casa do patrão dele. Como éramos muito humildes, fiquei encantado quando uma de suas filhas me pegou no colo e pediu para que eu desenhasse o Genésio Arruda. Quando terminei, ganhei um beijo. Nunca mais me esqueci disso”. Ele conta que não foi um bom aluno, e que jamais conseguiu memorizar Geografia. Mas, em desenho, era o melhor do colégio.
No fim da década de 40, Lucchetti foi contratado pela revista “América” de Ribeirão Preto, para fazer desenhos publicitários. Além de embelezar todas as sessões à mão com tinta preta nanquim, ele também escrevia apreciações críticas, só não fazia reportagens.
Em 1960, Lucchetti fez, em Ribeirão Preto, a exposição “A intemporalidade do mito chapliniano” com 100 bicos de pena representadando “Carlitos”. É dele também o livro “Carlitos, um mito através da imagem”, da Editora Colégio. A obra traz cerca de 80 bicos de pena, todos de Carlitos representando seus vários gestos.
Mesmo não sendo católico, Lucchetti já pintou uma santa, que deu de presente para a sua namorada, hoje sua esposa. Já se passaram mais de 50 anos, e a pintura continua intacta. Ele já desenhou Jesus Cristo, muitos artistas relacionados à sétima arte e a própria mulher. Hoje, na casa de Lucchetti, em Jardinópolis (SP), é possível encontrar muitas de suas pinturas feitas com tinta a óleo.
Lucchetti é profético quando diz que é impossível pintar sem antes passar por um período de sonhos. Este quadro, que ele segura na foto, é um de seus preferidos.
O verdadeiro Rubens Lucchetti por trás dos mistérios
Eu não pertenço a esta realidade
Amanda Ferreira
Ivani Rosa
Com as primeiras pesquisas descobriu-se um homem por trás dos roteiros de José Mojica Marins. Não que Zé do Caixão menos grandioso, mas talvez Lucchetti seja mais misterioso. Este é um fato que foi observado no desenvolvimento das pesquisas.
Lucchetti já escreveu cerca de 1400 livros, fez roteiros para José Mojica, Ivan Cardoso, entre outros. Foi também colaborador de revistas estrangeiras de ficção cientifica e cinema. No primeiro encontro, foi visível que tudo o que aconteceria a partir daquele momento seria único, pois o grupo estava frente a frente com aquele que, muitas vezes, o fez viajar em suas histórias de mistério e horror.
Para Rubens, não existe época e nem realidade para criar seus roteiros e livros. Ele cresceu lendo literatura policial inglesa e confessa que é impossível escrever suas histórias tendo como base o Brasil.
Lucchetti já morou em diversas cidades como Rio de Janeiro, São Paulo e Ribeirão Preto. Hoje mora em Jardinópolis. Após anos de serviços prestados à cultura de Ribeirão, tem no MIS (Museu da Imagem e do Som), uma sala com o seu nome.
Ele revela-se um homem que ainda usa máquina de escrever para fazer seus textos. Não se interessa pelo cinema novo brasileiro e não gosta da maioria dos programas de televisão.
Além de não gostar dos programas televisivos, Lucchetti também não gosta de participar deles. Ele contou que já teve a oportunidade de estar no “Programa do Jô”. Mas desistiu. “Um dia assisti ao programa e o achei um tanto mal educado com seus entrevistados”.
O grupo ficou à vontade para perguntar o que quisesse a Lucchetti. Ele disponibilizou sua biblioteca com cerca de 40 mil exemplares a seu acervo pessoal.
Por trás do homem misterioso descobriu-se uma pessoa carismática, simpática, que gosta da reclusão em que vive e que não precisa da popularidade com que muitos sonham.