segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

Os Trapalhões: Marco Altberg


Marco Altberg
Produtor executivo


Como surgiu o convite para trabalhar com Os Trapalhões?
Fui diretor de operações da Embrafilme durante quase dois anos, logo antes de o presidente Fernando Collor decretar sua extinção. Nessa ocasião, resgatamos as produções deles para voltarem a ser distribuídas pela empresa estatal. Elas estavam sendo distribuídas por distribuidoras privadas, porque a Embrafilme, por algum motivo, havia, anos antes, deixado de distribuir seus filmes. Nós, então, resgatamos com sucesso, porque sempre era bilheteria garantida. Quando houve o desastre Collor, que acabou com os organismos oficiais voltados para o cinema, eu voltei para o mercado. Após uma rápida temporada nos Estados Unidos, iniciei conversações com a R. A. Produções e acertamos que minha empresa produtora na época, a Diadema, produziria dois filmes: O Mistério de Robin Hood, que teria a participação da Xuxa; e Os Trapalhões e a Árvore da Juventude.

Antes de iniciar essa parceria profissional com Os Trapalhões, você já acompanhava os seus filmes?
Como profissional da área, sim. A comunidade cinematográfica era bem menor do que hoje e havia muita troca. Acompanhava os filmes, seus integrantes, equipes, resultados, com o interesse do desenvolvimento do nosso mercado.

Nos dois filmes que você trabalhou como produtor dos filmes dos Trapalhões, o Zacarias já tinha morrido. Na sua avaliação, qual o impacto da ausência dele nesses dois filmes?
Ele fazia falta, sem dúvida. Era um quarteto. Peguei o trio. Mas eles se superavam e eram sempre extraordinários. Cada um do seu jeito: Mussum, Dedé e Didi! Conteúdo infantil genuinamente brasileiro. E fazer filmes com eles era sempre uma festa! Representantes de uma época mais ingênua e pura.

Que representava, naquele período, trabalhar em um filme com Os Trapalhões, que eram certeza de sucesso de bilheteria?
Era um momento diferente e difícil do cinema brasileiro. O país vivia dias turbulentos na política. As produções minguaram, com o fim da Embrafilme. Fizemos os dois filmes com recursos dos exibidores e distribuidores. O chamado investimento público havia desaparecido. Era um grande desafio, apesar da tradição comercial do grupo.
Fizemos produções com mais qualidade de produção, investindo em direção de arte, fotografia. Foi o primeiro filme do grupo no sistema de som Dolby.

Renato Aragão, Dedé e Mussum tinham como característica a irreverência. Até nos bastidores das filmagens, eles brincavam muito. Isso procede? As filmagens eram descontraídas?
Sim, muita alegria. Cheguei a fazer um making of dos bastidores do filme Os Trapalhões e a Árvore da Juventude, que filmamos em Manaus e arredores. Esse making of registrou momentos maravilhosos de descontração dos três e as brincadeiras entre eles.

Como era o seu contato com eles (Didi, Dedé e Mussum)?
Eu era o executivo de produção encarregado de colocar o filme em pé. José Alvarenga Júnior dirigiu os dois filmes. Na verdade, montamos uma mesma equipe para os dois filmes. Meu contato direto era com o Paulinho Aragão, filho do Renato. Era tudo muito harmonioso, dava tudo certo.

Quem era o maior comediante do grupo?
Eles alternavam. Mas, evidentemente, Mussum se destacava na espontaneidade; e Renato era o mestre que orquestrava a cena. Dedé acompanhava por música. Eles tinham entrosamento incrível, não apenas eles mas também os coadjuvantes que os acompanhavam há anos.

Renato Aragão tem fama de ser perfeccionista. Isso procede? Ele acompanha tudo?
Sempre muito cioso das gags e piadas. Tinha uma inspiração chapliniana, adaptada pra cultura brasileira. Sabia do riscado direitinho e se entregava em cena.

Por que, na sua visão, os críticos e a Academia rejeitam os filmes produzidos e estrelados pelos Trapalhões?
Nas poucas vezes que um filme dos Trapalhões tinha boas críticas, Renato brincava que ia ser um fracasso. Ele acreditava que o sucesso de público era proporcionalmente contrário ao sucesso de crítica. E tinha razão. Hoje, imagino que seus filmes sejam vistos com uma certa tolerância histórica, uma vez que não existem mais... Mas o fato é que era muito importante a permanência de uma marca infantil brasileira de filmes que fizesse frente aos filmes internacionais.

Como classifica o cinema feito pelos Trapalhões?
São filmes que tiveram seu momento histórico e desempenharam papel fundamental na cinematografia brasileira. Menos em linguagem, mais em ocupação de mercado. Esses dois fatores são igualmente importantes para a história e desenvolvimento de uma cinematografia.
Foram tantos filmes, tão diversos entre sí, produzidos de diferentes maneiras que não ousaria em classificá-los num todo, mas sim pelos seus resultados.

No filme Os Trapalhões e a Árvore da Juventude, Os Trapalhões são guardas ambientais que tentam preservar a floresta amazônica da devastação. Em toda a filmografia de Renato há essa preocupação com o meio ambiente. Nesse filme isso é ainda mais explícito. Ele mencionava essa preocupação para vocês?
Havia sempre um bom sentimento por trás de seus filmes. Nesse caso específico, causas humanitárias. Quando se faz conteúdo para crianças, a responsabilidade aumenta. Eles tinham isso muito presente.

Os filmes dos Trapalhões eram bem recebidos pelo público, mas pouco foram premiados. Nesse caso, em particular, vocês foram premiados no III Festival de Cine Infantil de Ciudad Guayana (Venezuela), em 1993. Qual foi a repercussão entre vocês dessa premiação?
Por incrível que pareça, não tenho esse registro. Como éramos produtores contratados e minoritários, permanecendo a R. A. Produções como produtora majoritária, a vida comercial do filme, assim como seus desdobramentos eram de responsabilidade da R. A. Mas fico muito feliz desse feito. Talvez resultado da nossa contribuição no valor de produção do filme. Quer dizer: no esmero técnico e artístico.

Esse foi o último filme dos Trapalhões com o trio remanescente, após a morte de Zacarias. Foi também o último filme de Mussum, falecido em 1994. Gostaria de saber se havia, nas filmagens, uma tristeza entre os integrantes (Renato, Dedé e Mussum) com a ainda recente morte de Zacarias.
No que pude perceber, ele era sempre lembrado com carinho e saudade.

Quais as lembranças da direção do cineasta José Alvarenga Júnior, nessa produção?
O Zé já havia dirigido eles em outros filmes, e era um retorno dele a essa função. Mas foi diferente, porque ele contou com uma produção em que ele pôde experimentar mais e exercer a função com mais desenvoltura e criatividade.

Havia uma pressão comercial de produzir naquele ritmo, dois filmes por ano, mesmo com a morte de Zacarias?
Não que me conste.

Havia a intenção de fazer da Xuxa uma integrante dos Trapalhões?
Não participei dessa negociação. Minha atuação foi restrita aos filmes.

A Xuxa estava no auge da sua beleza e popularidade. Qual a sua avaliação dela como atriz?
A Xuxa era uma marca. Não acredito que ela mesma se veja como uma atriz na ampla acepção da palavra. Mas cumpriu seu papel com eficiência no filme.