quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010
No ar: Ivan Cardoso
O GÊNIO DO TERROR
Há poucos escritores que tenham mentido tanto e tão apaixonadamente embaido os seus leitores como R.F. Lucchetti.
Seus disfarces e falsidades são inumeráveis. Antes de abrir um de seus livros, ele já apresenta uma mistificação: na capa ou no prólogo lê-se um nome que não é o seu... pois Lucchetti, lhanamente, começa por ocultar o seu próprio nome. Às vezes, lhe antepõe um título nobiliárquico. Só no pseudônimo, na informação falsa é que se sente bem.
Nesta entrevista, exclusiva para a Tribuna BIS, ficamos sabendo um pouco mais dessa personalidade ímpar e misteriosa, o único autor brasileiro especializado em novelas policiais, de terror, histórias em quadrinhos e roteiros cinematográficos:
Já li muitas definições a seu respeito, uma delas, que é um autor de ‘short history of mystery magazine’. O que é isso?
Lucchetti – Esse é um gênero de histórias cultivadas pelas revistas conhecidas como ‘pulps’ (no Brasil tivemos várias: ‘Policial em Revistas’. ‘X-9’, ‘Meia Noite’, ‘Detective’, etc.), tendo como exemplo autores como Raymond Chandler e Dashiell Hammett. Ou seja, autores cuja produção literária saíram inicialmente nessas revistas, obedecendo a uma nomenclatura própria. Nesse caso, nem sempre o enredo é tão importante e sim as cenas criadas.
Quantos livros você já escreveu, como ‘ghost writter’?
Lucchetti – Com toda a sinceridade não sei. Embora possua em meu arquivo um exemplar de tudo quanto escrevi e foi publicado, nunca me dei ao trabalho de contar. Acredito que passem dos quinhentos títulos...
Cite alguns dos pseudônimos ou heterônimos que você usa.
Lucchetti – Theodore Field, William Collison, Frank Luke, Robert Branson, Roger M.Thomas, Brad Steiger, Frank King...
Mas você usa, também, alguns femininos?
Lucchetti – Os femininos... (pensa um pouco), Helen Reilly, Helena Bartons, Isadora Highmith, Cristine Gray, Doroty Burgess, Mary Shelby, Vera Waleska... foram mais para assinar novelas de horror gótico. Segundo os editores, “elas” exercem um certo fascínio sobre os leitores.
Você é autor de dezenas de novelas de horror. Algum outro escritor brasileiro perseguiu esse gênero?
Lucchetti – O horror, realmente, nunca seduziu os nossos autores. Esse gênero tem sido explorado, unicamente, nas histórias em quadrinhos. Aí sim, temos verdadeiros expoentes como Jorge Scudellari, Nico Rosso, Jaime Cortez, Rodolfo Zalla, Eugênio Colonnese, entre muitos outros. Já no gênero fantástico vamos encontrar excelentes exemplos, nos textos de Monteiro Lobato, Humberto de Campos e Machado de Assis.
Talvez aqui o horror seja considerado “subliteratura”?
Lucchetti – “A subliteratura” está somente na cabeça dos preconceituosos. Eu prefiro a classificação de boa ou má literatura. Um livro é bem escrito ou mau escrito... O resto é bobagem!
“Os filmes devem ser feitos com pedaços de sonhos. O sonho pode ser um pesadelo, mas é sempre uma fantasia...”. Foram as palavras do escritor R.F. Lucchetti – o Lovecraft de Ribeirão Preto – numa animada conversa com o crítico Salviano Cavalcanti de Paiva.
Rio, Sexta-feira, 19 de junho de 1992.
Tribuna da Imprensa