OS TRAPALHÕES E EU
Corria o ano de 1985. E a notícia estourou como uma bomba
junto ao público: os Trapalhões estavam se separando. Tinham se desentendido, e
o Didi (Renato Aragão) ficou de um lado e os outros três (Dedé, Mussum e
Zacarias), do outro.
Estes últimos chegaram a fundar uma empresa – Demuza – para
continuar com as atividades enquanto tentavam se acertar nos negócios.
Separação sempre dá nisso. Principalmente quando sobram coisas para dividir. E
eles tinham milhões de motivos para se preocupar: os milhões de espectadores de
seus programas que não se conformavam com a hipótese de não vê-los mais juntos.
Daria para dividir esse público? E que parcela ficaria do lado do Didi? Ou do
lado dos outros três?Ninguém queria essa cisão. Lá no fundo, nem eles.
Mas vozes de fora incitavam a desunião.
E enquanto corria a tentativa de acertos com desacertos e
desencontros, restava um problemão: e o filme que tradicionalmente os
Trapalhões faziam a cada seis meses e que arrastava milhões de fiéis fãs para
os cinemas?
Não estava sendo possível nem reunir os quatro com
advogados, quanto mais num set de filmagens.
Só se houvesse uma solução para uni-los de novo
virtualmente...
E foi o que conseguimos com a ideia de realizar um desenho
animado dos Trapalhões.
Já tínhamos “brincado” de animação num pequeno momento do
filme anterior deles – Os Trapalhões no
Reino da Fantasia -, onde entravam, além dos nossos desenhos, a Xuxa e o
Beto Carreiro.
Mas agora a coisa era mais difícil: tínhamos que realizar um
longa-metragem em poucos meses para que a “tradição” dos Trapalhões no cinema
se mantivesse.
Na ocasião eu tinha uma produtora de filmes de animação, a
Black & White, que estava realizando os desenhos da Turma da Mônica. Tive
que separar desenhistas, animadores, procurar outros profissionais, e saímos
para a empreitada.
Foi uma loucura. Uma corrida contra o tempo. Até eu entrei
de “artista”, contracenando em alguns momentos com os Trapalhões. E terminamos
o filme. Conseguíamos que eles fossem aos estúdios de gravação e dessem vozes
aos personagens que eu desenhara. E era uma festa de bom humor e criatividade.
Sem falar da participação especial e extraordinária do humorista Zé
Vasconcelos, que dava voz ao vilão da história, o Bruxo.
E assim terminamos o filme. Conseguimos reunir os Trapalhões
de novo, apesar de virtuais. Atingimos o objetivo maior: não faltariam
“Trapalhões” para as férias da criançada.
O resultado, em termos artísticos, deixou a desejar. A
pressa, os prazos loucos, não nos permitiram aparar arestas. Mas cumprimos com
a promessa junto aos quatro. E, se houvesse necessidade de mais um filme, já
estávamos preparados para um trabalho mais tranquilo e de qualidade. Porém,
ninguém queria isso. Queríamos mais é que eles fizessem as pazes e continuassem
a nos divertir com suas trapalhadas nos espetáculos. Não na vida real.
E felizmente foi o que aconteceu. Logo em seguida
reuniram-se de novo e continuaram a nos dar sua graça e humor por muito tempo.
Sobrou para nós todos, nos estúdios, a lembrança de um
trabalho feito sob pressão, mas com o coração. Afinal, somos todos fãs do humor
gostoso, circense, dos Trapalhões.
Pena que há outros tipos de separação, sem volta: Mussum e
Zacarias se foram, o Dedé está noutra e o Renato (Didi) arrasta sozinho a aura
dos quatro.
Ainda bem que há o videoteipe e um arquivo enorme, que nos
põe os Trapalhões vivos e unidos, de novo, em nossas telinhas.
Mauricio de Sousa
Crônica publicada no Diário de Mogi.
17/outubro/1997