segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Alex Moletta



Dramaturgo, roteirista e diretor. Formado pela Fundação das Artes de São Caetano do Sul, escreve para teatro, cinema e História em Quadrinhos. É fundador da Companhia Fatídicos de Teatro e Audiovisual na cidade de Mauá, no ABC Paulista.

Qual é a importância histórica que o curta-metragem tem no cinema brasileiro?
Penso que o curta-metragem, e sobretudo a vídeo produção independente no Brasil, serviram de escola para realizadores que não tinham acesso aos meios de produção cinematográfica, até então, e viram neste formato a possibilidade de explorar linguagens inviáveis para se produzir com película. Os primeiros equipamentos de videotape começaram a ser importados, por entusiastas da nova tecnologia, e disponibilizados aos artistas plásticos e aspirantes a cineastas que utilizavam a câmera de vídeo como suporte para novas formas de linguagens artísticas e performáticas, dando voz a camadas excluídas da sociedade por meio de documentários em vídeo. Um grupo que marcou bem esse processo de transformação do audiovisual brasileiro no anos 80 foi o “Olhar Eletrônico”, formado por artistas como Marcelo Machado, Fernando Meirelles, Renato Barbieri, Paulo Morelli e Marcelo Tas.

O grupo “Olhar Eletrônico” começou realizando vídeos de curtas metragens (com três ou quatro minutos de duração) nos quais experimentava uma linguagem de extrema concentração e explorava de maneira inventiva aquilo que os americanos chamam de machine-gun (corte-metralhadora), uma técnica de montagem acelerada, com planos bastante breves e cortados em ritmos sincopados, introduzidos no Brasil por um pioneiro da videoarte, Roberto Sandoval, podemos observar que o resultado desse processo se revela no filme “Cidade de Deus” do mesmo Fernando Meirelles, com sua agilidade nos cortes das imagens e dinâmica de narrativa cinematográfica, que influenciou vários outros filmes posteriores e vai continuar influenciando.

Dessa forma, podemos perceber apenas um fragmento da importância da produção de curtas-metragens e de vídeo produção independente no cinema brasileiro, creio, sem sombra de dúvida, que esses formatos de produção audiovisual (vídeo de curta-metragem) serão responsáveis pela formação artística das novas safras de roteiristas, diretores, montadores e produtores do cinema nacional.

Por que os curtas não têm espaço em críticas de jornais e atenção da mídia em geral?
Hoje há muito mais espaço nesses veículos para o curta-metragem que antigamente. O curta-metragem sempre esteve relacionado à experimentação, boa parte dos primeiros trabalhos de curtas-metragens em vídeo nas décadas de 70 e 80, em virtude dessa liberdade de linguagem, eram vistos somente como obras videoarte, despertando pouco interesse da mídia direcionada ao cinema. Essa visão de que curta-metragem é só uma “experimentação” não existe mais, apesar do curta ainda servir como o melhor instrumento para “experimentar cinema e a arte” e mesmo tendo um movimento cada vez mais consistente com obras de videoarte e videoinstalação, o curta-metragem hoje é visto como obra cinematográfica, com espaços maiores de divulgação em festivais tradicionais de cinema e com milhares de mostras e festivais exclusivos para curtas-metragens no Brasil e exterior. Esse espaço na mídia especializada em cinema ainda não é o ideal, mas com a importância da internet na produção audiovisual e a crítica se alimentando cada vez mais da internet para pensar a arte, este espaço para o curta-metragem só tende a crescer.

Na sua opinião, como deveria ser a exibição dos curtas para atingir mais público?
Como está já sendo feito hoje: pela internet. Nunca houve, na história da arte, um espaço tão democrático e eficiente como a internet. Qualquer realizador, em qualquer lugar do mundo, pode realizar uma obra audiovisual de curta-metragem, postar na internet e este trabalho ser exibido no mundo todo! Aquele realizador que não tinha acesso aos meios de divulgação tradicionais, pode contar com o efeito multiplicador da rede mundial de computadores.

Um curta-metragem que seria visto normalmente por cem, duzentas pessoas, pode ser assistido por milhares. Quando a obra tem uma visão de mundo interessante, é narrada de forma eficiente e possui uma experiência humana, seu público será exponencialmente multiplicado, pois na internet quem assiste e gosta indica para seu amigo, que se também gostar vai indicar para outros e assim a divulgação “boca a boca” faz o sucesso do trabalho, que muitas vezes, acaba ganhando espaço fora da rede, na TV aberta e na mídia em geral. Portanto creio a exibição de curtas pela internet é a forma mais eficiente de divulgar uma obra audiovisual sem grandes custos e sem depender dos mecanismos tradicionais e onerosos de divulgação. Principalmente num momento de convergência da internet com a TV Digital, onde o conteúdo de uma interfere na outra.

É possível ser um cineasta só de curta-metragem? Vemos que o curta é sempre um trampolim para fazer um longa...
É possível sim. Muitos desses cineastas são chamados também de curta-metragistas. São artistas que se dedicam exclusivamente à criação e realização de curtas-metragens por opção artística ou de logística. O formato curto no audiovisual reduz consideravelmente o tempo de gestação e realização de uma obra, também possui proporcionalmente um volume menor de investimento financeiro e humano. Enquanto um longa demora um, dois, três anos ou mais para ser realizado, um curta-metragem pode demorar apenas um, dois, três dias. Esse fator é decisivo para artistas que não querem esperar mais de um ano para começar a construir sua história na tela. É uma excelente forma de se “aprender a fazer cinema”, imaginemos a situação dificílima, em que muitos cineastas já passaram, de aprender dirigindo um primeiro longa-metragem, com a responsabilidade de milhões de reais em orçamento, contratos de distribuição e divulgação, centenas de profissionais envolvidos, sem nunca ter feito nada antes, apenas um aprendizado teórico? Esse é um dos grandes motivos dos diretores começarem suas carreiras dirigindo curtas-metragens, ganhando experiência, aprendendo a lidar com todo o aparato técnico e a se relacionar com os demais profissionais que uma produção audiovisual de grande porte exige. Nesse sentido o curta-metragem é um ótimo trampolim para quem sempre sonhou em dirigir um primeiro longa.

O curta-metragem é marginalizado entre os próprios cineastas?
Creio que já foi, hoje em dia, não mais. Um diretor que realizou curtas-metragens que ganharam destaque em mostras e festivais é tratado como um diretor como qualquer outro pelos cineastas, porque o meio profissional audiovisual sabe da importância da produção de curtas-metragens para a arte do cinema, talvez o reconhecimento de crítica e público sim, ainda marginaliza pelo fato tradicional do longa ser exibido nas salas de comerciais cinema e o curta não. Como não há espaço para exibição nas redes de cinemas comerciais, ainda há essa distinção entre um diretor de longa-metragem ou de curta-metragem, talvez por esse motivo o curta-metragem ainda fique “à margem” do circuito tradicional de cinema.

Pensa em dirigir um curta futuramente?

Estou trabalhando num projeto de um curta-metragem de animação com estética de HQ. Um roteiro que escrevi para história em quadrinhos que vou adaptar para animação. O curta vai se chamar “A Fuga” e conta a história de uma detenta, Lúcia, condenada por duplo assassinato, que tenta fugir da penitenciária feminina. Quem tiver curiosidade pode assistir um pequeno trailer no link: http://www.youtube.com/watch?v=PMl6v3GdT6k Para conhecer melhor meu trabalho acesse nosso site: www.ciafatidicos.com.br