AURORA
CHAVES
Continuísta
Você
trabalhou junto à direção do filme Os
Trapalhões e a Árvore da Juventude, como
continuísta. Como recebeu o convite para trabalhar com Os Trapalhões?
Já
havia trabalhado com José Alvarenga Júnior em outros filmes em 1986; e, em 1987,
ele me convidou para filmarmos pela primeira vez com Os Trapalhões em Os Fantasmas Trapalhões. A
direção foi de J. B. Tanko, e Alvarenga foi o diretor assistente. Voltei a
trabalhar com eles em: Os Trapalhões na
Terra dos Monstros, com direção de Flávio Migliaccio.
Depois, em A Princesa Xuxa e Os Trapalhões,
O Mistério de Robin Hood e
Os Trapalhões e a Árvore da Juventude,
todos três dirigidos por José Alvarenga Júnior. O convite sempre partiu da
direção. Continuísta é cargo de confiança da direção.
Você
já trabalhou em outras produções cinematográficas, com outros diretores e
outros atores. Que sigifica para a sua carreira esse trabalho com Os Trapalhões?
Sempre
gostei muito de trabalhar com Os
Trapalhões por muitos motivos: gostava de trabalhar
para crianças, amava fazer humor com eles, as produções eram de excelente
nível, a equipe com os melhores profissionais do mercado e o clima de trabalho
sempre muito familiar e divertido. Tenho Renato, Dedé, Zacarias e Mussum como
grandes amigos. Tenho muita honra e orgulho de ter participado dos filmes
deles.
Qual
era o diferencial de Renato, Dedé e Mussum?
Renato
Aragão é um grande artista e sempre soube ser um grande empresário. Reuniu um
grupo excelente de humoristas brasileiros e desenvolveu um trabalho que
agradava a todas as idades. Crianças e adultos assistiam Os Trapalhões em casa e
no cinema, ele filmava para as férias de julho e de dezembro. Via o cinema com
os olhos de cineasta, sabia que filme queria fazer. Teve uma das melhores
produtoras de Cinema do Brasil, a R. A. e mantinha sempre excelentes profissionais
nos seus trabalhos. Ajudou muito a indústria cinematográfica brasileira a
desenvolver-se, mantendo-se sempre muito bem atualizado tecnicamente em
excelentes produções. Desenvolveu com Os Trapalhões
uma linguagem própria na televisão e no
cinema, misturando um humor chapliniano a um trabalho único de cartoon do Zacarias, trazendo o
urbano brasileiro com Dedé e a malandragem e ritmo do Mussum. Nenhum grupo de
humor foi tão longe por tanto tempo.
No
filme Os Trapalhões e a Árvore da
Juventude, Os Trapalhões são
guardas ambientais que tentam preservar a floresta amazônica da devastação. Em
toda a filmografia de Renato há essa preocupação com o meio ambiente. Nesse
filme, ela é ainda mais explícita. Ele mencionava essa preocupação para vocês?
Ele
sempre participou do roteiro, escolhendo os temas e a abordagem. Sabíamos que
ele aprovava tudo e todos; mas no set de
filmagem ele se entregava totalmente ao humor, sendo muitas vezes
indisciplinado como uma criança feliz e fazendo todos se lembrar que estávamos
ali para fazer um lindo trabalho de humor. Ele sempre brincou com a fantasia e
a realidade, misturando tudo e aproveitando para mandar seus recados. A
ecologia era um deles.
Onde
essa produção foi filmada?
No
Rio de Janeiro e em Manaus, no Rio Negro.
Os
filmes dos Trapalhões eram
bem recebidos pelo público, mas poucos foram premiados. Nesse caso, em
particular, vocês foram premiados no III
Festival de Cine Infantil de
Ciudad Guayana (Venezuela), em 1993. Qual foi a repercussão entre vocês dessa
premiação?
Premiação
é algo sempre muito político, mas também é o reconhecimento do trabalho. Foi
muito bem-vinda e deixou todos felizes.
Esse
foi o último filme dos Trapalhões
com o trio remanescente, após a morte de
Zacarias. Foi também o último filme de Mussum, falecido em 1994. Gostaria de
saber se havia, nas filmagens, uma tristeza entre os integrantes (Renato, Dedé e
Mussum) com a ainda recente morte de Zacarias.
Estávamos
no Rio Negro, filmando uma sequência de ação; e reparei que uma borboleta
estava há algum tempo entre nós na margem do rio. O Renato chegou, e essa
borboleta pousou nele. Comentei com o Renato que ele tinha sido o único escolhido
por ela. Ele me disse na hora: “É o
Zacarias que está cuidando da gente. Vai trazer sorte.”
Tive que segurar as lágrimas e admitir que pensava o mesmo. Zacarias era uma
pessoa muito doce e espiritualizada.
Quais
as lembranças que você possui do Mussum?
As
mais alegres e divertidas. Mussum era uma pessoa muito querida, mas muito engraçada
e nada escapava ao humor dele. Em O
Mistério de Robin Hood, ele trabalhava no
circo e limpava a jaula dos elefantes. Na hora de filmar, Mussum resolveu
chamar a elefanta de Auroris;
e a elefanta fazia a maior bagunça com ele e jogava com a tromba tudo em cima dele,
inclusive água. Eu tive que me controlar para não rir em cena e estragar tudo.
Toda a equipe se segurou e riu junto, assim que Alvarenga gritou “corta!” Ri muito e fiquei
lisonjeada com a homenagem.
Que
representou para você trabalhar no filme em que foi usado pela última vez o
termo Trapalhões no
título?
Foi
o apagar das luzes da produção nacional. O presidente Fernando Collor havia
acabado com a Embrafilme, e a produção de filmes ficou totalmente parada por
alguns anos. Esse foi o último filme desse período e também dos Trapalhões. Hoje,
vejo nessa coincidência uma parada brusca na produtividade cultural.
Pessoalmente, foi o término da minha carreira no cinema; depois, migrei para a
tevê, onde estou até hoje.
Renato
Aragão, Dedé e Mussum tinham como característica a irreverência. Até nos
bastidores das filmagens, eles brincavam muito. Isso procede? As filmagens eram
descontraídas?
Sim,
muito descontraídas. Nunca houve briga ou clima pesado. Ao contrário, a
brincadeira imperava. Renato sempre escondia a claquete ou o microfone para na hora
de rodar quebrar a tensão e fazer a equipe rir. Também provocava erros no final
das cenas, para gerar uma nova piada ou brincadeira entre o elenco. Impossível
contracenar com ele sem rir.
Havia
muita improvisação?
Sim,
ele provocava para ter cenas engraçadas com “erros”.
Uma espécie de “falha nossa”.
Quais
as recordações que possui do filme?
Navegar
no Rio Negro por dias foi uma das melhores experiências. Na época, Manaus ainda
era Zona Franca; e o consumo era uma das atrações. Walter Carvalho fez uma luz
linda, e toda a equipe se uniu muito com a viagem. Foi muito prazeroso.
Quais
as lembranças da direção do cineasta José Alvarenga Júnior, nessa produção?
Sempre
me diverti trabalhando com o Alvarenga, ele ri baixinho durante a filmagem. Tem
sempre objetividade, facilitando o fluir do humor. Nossos ensaios eram sempre
democráticos, e somente quando todos estavam prontos ele rodava. Gosto muito de
trabalhar com ele.
Por
que, na sua visão, os críticos e a Academia rejeitam os filmes produzidos e estrelados
pelos Trapalhões?
Os Trapalhões sempre
tiveram apelo comercial; e, apesar de as produções buscarem técnicas novas, os
filmes buscavam diversão para todas as idades e não críticas sociais ou
propostas estéticas ousadas. Eram feitos para crianças de todas as idades.
Como
classifica o cinema feito pelos Trapalhões?
Um
produto de humor 100% nacional! Feito para todas as idades.
Gostaria
que contasse alguma curiosidade desse filme, em especial do seu trabalho.
Tudo
que posso me lembrar termina com uma boa gargalhada. Até mesmo quando tudo
parecia poder gerar um problema, terminava com bom humor. Muita vezes precisei
dar conta sozinha de duas ou três câmeras rodando simultaneamente. Mas, sempre
que a situação me deixava tensa, Renato ou Mussum me faziam rir. Ganhei muita
velocidade com esses filmes, mas ganhei também grandes amigos e muitas risadas.