sábado, 1 de abril de 2017

Os Trapalhões: Aurora Chaves


AURORA CHAVES
Continuísta


Você trabalhou junto à direção do filme Os Trapalhões e a Árvore da Juventude, como continuísta. Como recebeu o convite para trabalhar com Os Trapalhões?
Já havia trabalhado com José Alvarenga Júnior em outros filmes em 1986; e, em 1987, ele me convidou para filmarmos pela primeira vez com Os Trapalhões em Os Fantasmas Trapalhões. A direção foi de J. B. Tanko, e Alvarenga foi o diretor assistente. Voltei a trabalhar com eles em: Os Trapalhões na Terra dos Monstros, com direção de Flávio Migliaccio. Depois, em A Princesa Xuxa e Os Trapalhões, O Mistério de Robin Hood e Os Trapalhões e a Árvore da Juventude, todos três dirigidos por José Alvarenga Júnior. O convite sempre partiu da direção. Continuísta é cargo de confiança da direção.

Você já trabalhou em outras produções cinematográficas, com outros diretores e outros atores. Que sigifica para a sua carreira esse trabalho com Os Trapalhões?
Sempre gostei muito de trabalhar com Os Trapalhões por muitos motivos: gostava de trabalhar para crianças, amava fazer humor com eles, as produções eram de excelente nível, a equipe com os melhores profissionais do mercado e o clima de trabalho sempre muito familiar e divertido. Tenho Renato, Dedé, Zacarias e Mussum como grandes amigos. Tenho muita honra e orgulho de ter participado dos filmes deles.

Qual era o diferencial de Renato, Dedé e Mussum?
Renato Aragão é um grande artista e sempre soube ser um grande empresário. Reuniu um grupo excelente de humoristas brasileiros e desenvolveu um trabalho que agradava a todas as idades. Crianças e adultos assistiam Os Trapalhões em casa e no cinema, ele filmava para as férias de julho e de dezembro. Via o cinema com os olhos de cineasta, sabia que filme queria fazer. Teve uma das melhores produtoras de Cinema do Brasil, a R. A. e mantinha sempre excelentes profissionais nos seus trabalhos. Ajudou muito a indústria cinematográfica brasileira a desenvolver-se, mantendo-se sempre muito bem atualizado tecnicamente em excelentes produções. Desenvolveu com Os Trapalhões uma linguagem própria na televisão e no cinema, misturando um humor chapliniano a um trabalho único de cartoon do Zacarias, trazendo o urbano brasileiro com Dedé e a malandragem e ritmo do Mussum. Nenhum grupo de humor foi tão longe por tanto tempo.

No filme Os Trapalhões e a Árvore da Juventude, Os Trapalhões são guardas ambientais que tentam preservar a floresta amazônica da devastação. Em toda a filmografia de Renato há essa preocupação com o meio ambiente. Nesse filme, ela é ainda mais explícita. Ele mencionava essa preocupação para vocês?
Ele sempre participou do roteiro, escolhendo os temas e a abordagem. Sabíamos que ele aprovava tudo e todos; mas no set de filmagem ele se entregava totalmente ao humor, sendo muitas vezes indisciplinado como uma criança feliz e fazendo todos se lembrar que estávamos ali para fazer um lindo trabalho de humor. Ele sempre brincou com a fantasia e a realidade, misturando tudo e aproveitando para mandar seus recados. A ecologia era um deles.

Onde essa produção foi filmada?
No Rio de Janeiro e em Manaus, no Rio Negro.

Os filmes dos Trapalhões eram bem recebidos pelo público, mas poucos foram premiados. Nesse caso, em particular, vocês foram premiados no III Festival de Cine Infantil de Ciudad Guayana (Venezuela), em 1993. Qual foi a repercussão entre vocês dessa premiação?
Premiação é algo sempre muito político, mas também é o reconhecimento do trabalho. Foi muito bem-vinda e deixou todos felizes.

Esse foi o último filme dos Trapalhões com o trio remanescente, após a morte de Zacarias. Foi também o último filme de Mussum, falecido em 1994. Gostaria de saber se havia, nas filmagens, uma tristeza entre os integrantes (Renato, Dedé e Mussum) com a ainda recente morte de Zacarias.
Estávamos no Rio Negro, filmando uma sequência de ação; e reparei que uma borboleta estava há algum tempo entre nós na margem do rio. O Renato chegou, e essa borboleta pousou nele. Comentei com o Renato que ele tinha sido o único escolhido por ela. Ele me disse na hora: “É o Zacarias que está cuidando da gente. Vai trazer sorte.” Tive que segurar as lágrimas e admitir que pensava o mesmo. Zacarias era uma pessoa muito doce e espiritualizada.

Quais as lembranças que você possui do Mussum?
As mais alegres e divertidas. Mussum era uma pessoa muito querida, mas muito engraçada e nada escapava ao humor dele. Em O Mistério de Robin Hood, ele trabalhava no circo e limpava a jaula dos elefantes. Na hora de filmar, Mussum resolveu chamar a elefanta de Auroris; e a elefanta fazia a maior bagunça com ele e jogava com a tromba tudo em cima dele, inclusive água. Eu tive que me controlar para não rir em cena e estragar tudo. Toda a equipe se segurou e riu junto, assim que Alvarenga gritou “corta!” Ri muito e fiquei lisonjeada com a homenagem.

Que representou para você trabalhar no filme em que foi usado pela última vez o termo Trapalhões no título?
Foi o apagar das luzes da produção nacional. O presidente Fernando Collor havia acabado com a Embrafilme, e a produção de filmes ficou totalmente parada por alguns anos. Esse foi o último filme desse período e também dos Trapalhões. Hoje, vejo nessa coincidência uma parada brusca na produtividade cultural. Pessoalmente, foi o término da minha carreira no cinema; depois, migrei para a tevê, onde estou até hoje.

Renato Aragão, Dedé e Mussum tinham como característica a irreverência. Até nos bastidores das filmagens, eles brincavam muito. Isso procede? As filmagens eram descontraídas?
Sim, muito descontraídas. Nunca houve briga ou clima pesado. Ao contrário, a brincadeira imperava. Renato sempre escondia a claquete ou o microfone para na hora de rodar quebrar a tensão e fazer a equipe rir. Também provocava erros no final das cenas, para gerar uma nova piada ou brincadeira entre o elenco. Impossível contracenar com ele sem rir.

Havia muita improvisação?
Sim, ele provocava para ter cenas engraçadas com “erros”. Uma espécie de “falha nossa”.

Quais as recordações que possui do filme?
Navegar no Rio Negro por dias foi uma das melhores experiências. Na época, Manaus ainda era Zona Franca; e o consumo era uma das atrações. Walter Carvalho fez uma luz linda, e toda a equipe se uniu muito com a viagem. Foi muito prazeroso.

Quais as lembranças da direção do cineasta José Alvarenga Júnior, nessa produção?
Sempre me diverti trabalhando com o Alvarenga, ele ri baixinho durante a filmagem. Tem sempre objetividade, facilitando o fluir do humor. Nossos ensaios eram sempre democráticos, e somente quando todos estavam prontos ele rodava. Gosto muito de trabalhar com ele.

Por que, na sua visão, os críticos e a Academia rejeitam os filmes produzidos e estrelados pelos Trapalhões?
Os Trapalhões sempre tiveram apelo comercial; e, apesar de as produções buscarem técnicas novas, os filmes buscavam diversão para todas as idades e não críticas sociais ou propostas estéticas ousadas. Eram feitos para crianças de todas as idades.

Como classifica o cinema feito pelos Trapalhões?
Um produto de humor 100% nacional! Feito para todas as idades.

Gostaria que contasse alguma curiosidade desse filme, em especial do seu trabalho.
Tudo que posso me lembrar termina com uma boa gargalhada. Até mesmo quando tudo parecia poder gerar um problema, terminava com bom humor. Muita vezes precisei dar conta sozinha de duas ou três câmeras rodando simultaneamente. Mas, sempre que a situação me deixava tensa, Renato ou Mussum me faziam rir. Ganhei muita velocidade com esses filmes, mas ganhei também grandes amigos e muitas risadas.