domingo, 1 de abril de 2018

Os Trapalhões: Paulo Souza


Paulo Souza
Gaffer de fotografia


Você trabalhou como gaffer de fotografia no filme Os Trapalhões e o Rei do Futebol. Como e em que circunstância recebeu o convite para trabalhar nesse filme? Como foi a experiência?
Nesse filme, eu não fui o gaffer. Fui chamado pelo produtor do filme, Caíque Ferreira, para fazer as filmagens do Maracanã, já que era um set enorme e precisava de várias equipes de eletricistas.

Braço direito do diretor de fotografia no set de filmagem, o gaffer é uma função pouco conhecida para quem não está envolvido diretamente com cinema. Pode nos contar o que ele faz exatamente?
No Brasil, a função gaffer começou basicamente comigo. Até então, chamava-se chefe de elétrica. Na década de 1980, fiz vários filmes estrangeiros e vi que tinha essa função, que era a que eu exercia no Brasil. A diferença é que o gaffer é como um diretor de fotografia assistente. Ele ajuda no conceito, entende de colorimetria, fotometria, lidera toda a equipe de eletricistas e maquinistas, gelatinas, distribuição de energia elétrica no set.

Falando especificamente do filme Os Trapalhões e o Rei do Futebol. Foi um desafio para você o número excessivo de externas? Como foi trabalhar nas cenas iniciais (partida de futebol num campo de várzea) e nas finais (no Estádio do Maracanã)?
Posso falar da parte do Maracanã. Foi muito trabalhoso. Era tudo muito longe. E, como filmamos à noite e não tínhamos os recursos de hoje, “mundo digital”, tinha que iluminar quase todo o estádio.

Os Trapalhões e o Rei do Futebol foi o último filme dirigido por Carlos Manga. Gostaria que falasse a respeito dele.
Não tive muita intimidade com o Manga. Fiz uns comerciais para a Tigre, aqueles com o inspetor Ted Tigre. Eu era muito amigo da assistente de direção dele, Marcia Burg, já falecida. Teve um episódio muito engraçado no primeiro dia no Maracanã. Estávamos nos preparando para filmar, e as coisas começaram a dar errado em alguns departamentos no set. Ele parou a filmagem e chamou toda a equipe no meio do campo e falou: “Vocês estão bons é para trabalhar com polaroid.”

Nessa produção, destaque para dois não-atores: Luiza Brunet e Pelé. Qual a sua avaliação deles no desenvolvimento do filme?
Eu já havia trabalhado com o Pelé em um filme que ele mesmo produziu: Pedro Mico. Com todo o respeito, ele como ator foi um ótimo jogador. Quanto à Luiza Brunet... Trabalhei com ela em um curta-metragem: S. O. S. Brunet!. Nesse tipo de filmes, não precisava ser ator; bastava fazer sucesso na mídia.

Que representava, naquele período, trabalhar em um filme com Os Trapalhões, que eram certeza de sucesso de bilheteria?
A equipe não tinha essa visão. 99% eram freelances.

Seu último filme com Os Trapalhões é também o último filme deles com a sua formação tradicional: Uma Escola Atrapalhada. Como surgiu a oportunidade de trabalhar nesse filme?
Na época, eu já era um dos melhores gaffers do Brasil e tinha muitos amigos que iriam fazer o filme e eles me perguntaram se eu estava afim de fazer. Fiz e adorei. O diretor de fotografia, Walter Carvalho, eu já conhecia há muito tempo, desde 1983, quando ele foi câmera em Quilombo, filme dirigido por Cacá Diegues.

Quais as suas lembranças do filme Uma Escola Atrapalhada?
Foi muito divertido fazer. Acho que não tenho nenhuma lembrança específica, com exceção de uma cena em que quase morreram os quatro. Foi assim: a galera dos efeitos especiais pediu para o produtor Caíque Ferreira vinte e cinco litros de gasolina, porque tinha uma cena de explosão do carro. E o Caíque disse: “Nem pensar. Vou dar apenas cinco.” Assim foi feito. Fomos filmar. O carro estava estacionado, e os quatro passavam por trás. Quando se acionou o botão do explosivo, foi um cogumelo de fogo que lambeu tudo e Os Trapalhões foram parar longe e por pouco não viraram churrasquinho.

Como foi trabalhar com Del Rangel, que dirigiu esse filme?
O Del é um cara muito bacana. Gosto muito dele. É um exemplo de profissional e amigo.

O filme foi o último com a participação de Zacarias, que faleceu naquele ano. A aparição dele no filme é melancólica, muito magro, abatido, numa cena curta. Como foi o seu contato com ele? Ele já estava doente?
Realmente, ele filmou pouco. Não tive muito contato com ele. Eu tinha mais contato com Renato e Dedé. Não percebi que o Zacarias estava com problemas. Ele fazia as cenas numa boa. Conversava com todo mundo.

O personagem de Zacarias, assim como os de Dedé Santana e Mussum, fizeram apenas uma breve aparição. A sensação é que pareciam figurantes no filme. Isso procede?
Não. Esse filme foi basicamente escrito para a Angélica e o grupo Polegar. Os Trapalhões fizeram uma participação.

Apesar do sucesso de bilheteria, o filme é considerado pela crítica o pior filme antes da morte de Zacarias. Qual é a sua opinião a respeito?
Acho que esse tipo de filme não tem essa de ser bom ou ruim. São filmes para dar dinheiro. São filmes comerciais. Veja pelo elenco: grupo Polegar, Gugu, Supla...

Quem era o maior comediante do grupo?
Renato e Mussum.

Renato Aragão tem fama de ser perfeccionista. Isso procede? Ele acompanha tudo?
Sim. Esse é um dos motivos do grande sucesso dos Trapalhões.

Por que, na sua visão, os críticos e a Academia rejeitam os filmes produzidos e estrelados pelos Trapalhões?
Porque são os únicos que davam bilheteria. Acho que, às vezes, precisamos nos tocar que ainda somos um país com um nível muito grande de analfabetos e semianalfabetos, ou seja, povão! E povão quer é sorrir e não ficar vendo filme-cabeça.

Como classifica o cinema feito pelos Trapalhões?
Chaplim, Mazzaropi, Oscarito, Grande Otelo, Chico Anysio, Golias, Os Trapalhões... Para mim, estão todos no mesmo nível, em diferentes épocas.

Gostaria que falasse o que representou para você trabalhar com Os Trapalhões, que carregaram, por muito tempo, o cinema nacional nas costas.
Fiz Os Trapalhões e o Rei do Futebol, Uma Escola Atrapalhada, Didi, o Cupido Trapalhão. Fico muito feliz de ter participado de um pouco dessa escalada. Um grupo de artistas que fez o Brasil sorrir por muito tempo. Lembro quando morava em Minas, eu ainda criança, meus pais sentados em frente à televisão esperando a hora de começar o programa dos Trapalhões. Passaram-se os anos, e eu aqui com eles. Não é maravilhoso? E ainda sou amicíssimo do Paulinho Aragão, filho do Renato, que é um cara muito gente boa.