sexta-feira, 26 de abril de 2013

Edwin Luisi

Quando descobriu a sua vocação profissional?
Foi num teste vocacional, muito comum na época. Estava meio perdido depois de largar meus estudos pra medicina por total incompatibilidade com a carreira que havia escolhido em criança. Como me senti confuso, meus pais me orientaram pra fazer o tal teste e deu Teatro como uma das três opções. Achei que não havia possibilidade de viver de arte e tentei outras faculdades, mas após ter ficado morando na França, com uma bolsa de estudos, decidi quando voltasse ao Brasil fazer a Escola de Arte Dramática da USP e foi aí que tudo começou. Não foi uma vocação e sim uma decisão.
 
Você iniciou sua carreira na função de ator quando entrou na Escola de Arte Dramática, da Universidade de São Paulo (USP). Em algumas profissões, como jornalista, não há necessidade de diploma. Você considera fundamental o ingresso acadêmico para se formar um ator?
Não acho fundamental, mas há um grande diferencial nos atores que fazem boas escolas. Ficamos três anos estudando, com matérias teóricas e praticas. Quando saímos estamos mais bem equipados para enfrentar o mundo profissional.
 
Você também estudou História da Arte. Qual era o seu intuito ao fazer esse estudo? Quais eram as suas preocupações?
Ganhei uma bolsa de estudos do governo francês no período que estava sem saber que rumo tomar na minha vida e o curso que me deram foi de Historia da Arte e Civilização Francesa. Na época nem dei tanta importância mas quando entrei na escola e depois no profissionalismo entendi que eu estava mais bem equipado para enfrentar meus textos . Tinha um conhecimento que muitos atores nem sequer imaginavam. Tenho uma base que me ajuda muito na hora de montar meus personagens, fora que por causa de minha longa estada na França , aprendi a falar francês e espanhol .
 
Sua entrada na Tupi, na novela ‘Camomila e Bem-Me-Quer’, 1972, foi turbulenta. Você abandonou as gravações por ter sido tratado mal. Como foi isso?
Minha participação em novelas da Tupi não são efetivamente boas lembranças. A emissora já estava num processo de declínio e tudo era muito difícil, mas nunca houve abandono de gravações e até fiz grandes amigos que são muito queridos até hoje. Acho que há alguma confusão nessa informação. Sempre disse que não fui feliz na Tupi, mas tudo em decorrência dos estertores pelo qual ela estava atravessando. Lembro também que éramos sete atores novos nessa novela e causamos algum ciúme no elenco que era fixo da emissora. Talvez seja isso a base dessa informação mas sempre fui muito disciplinado e jamais abandonaria uma gravação .
 
Acha que há um saudosismo desnecessário quando se fala na TV Tupi?
As pessoas que trabalharam lá durante anos e que fundaram a Tupi têm motivos de sobra para sentir saudade. Era uma televisão meio familiar numa época que a TV era vista como uma segunda casa para quem trabalhava em seus quadros. Assim foi com a Excelsior e com a antiga TV Record . Os profissionais davam a vida por suas casas de trabalho. Hoje é tudo mais empresa, mais frio, mais indústria. Além disso, a Tupi era uma grande geradora de programas que empregavam uma quantidade enorme de profissionais. O pessoal de São Paulo sente falta de uma TV forte que os empreguem com produções de qualidade como fazia a Tupi que foi uma grande inovadora. Fazia grandes novelas, teleteatro, musicais. Até hoje ha nomes de enorme importância no panorama televisivo e teatral que iniciaram suas carreiras lá.
 
Em 1977 você ganha projeção nacional no papel do galã Álvaro, na novela Escrava Isaura. Quais as suas recordações desse trabalho.
Foi uma coisa totalmente inesperada. Vinha fazendo teatro em SP depois que me formei e um dia o Gilberto Braga, que era critico de teatro no Rio, foi ver uma peça que fazia na época e ficou encantado com meu trabalho. Ele voltou ao Rio e pediu que a Globo me contratasse para fazer o galã na novela Escrava Isaura que iria começar. Como eu faria a peça que estava fazendo no Rio consegui juntar as duas coisas. Quando meu personagem entrou na trama eu já não consegui mais sair à rua tamanha repercussão. Claro que fiquei muito feliz com aquele carinho todo, mas também foi difícil dada a total invasão na minha vida. A novela foi um tremendo sucesso e fiquei conhecido no Brasil inteiro o que me facilitou para fazer minhas peças. Mudei-me para o Rio definitivamente e hoje sou paulista de alma e carioca de coração. Viajei muito através do sucesso da novela, fui a vários países a convite das televisões internacionais. “Escrava” me deu muitas alegrias e até hoje sou conhecido pelo papel de Alvaro . Sei que com essa novela faço parte da historia da televisão brasileira. Enfim, comecei no Rio com muita sorte ( a peça “A Margem da Vida “ que veio para o Rio tambem fez um baita sucesso ) e até hoje consigo fazer TV e Teatro da melhor qualidade .

Você assistiu ao remake feito pela TV Record anos depois? Se sim, o que achou?
Hoje vejo pouca novela. Estou sempre fazendo teatro o que me impede de assistir e não curto ficar gravando capítulos para ver depois. Não consegui ver nada do remake. Entre seus personagens clássicos está Felipe, o assassino de Salomão Hayalla na primeira versão da novela O Astro (1977), que virou macro série e volta para as telas da TV Globo. Gostaria que fizesse uma análise da primeira e segunda versão.

Não sou um teórico em dramaturgia e também não vi o remake de “O Astro”. Não sou muito dado a analises de novelas. Enxergo apenas como entretenimento. Posso falar que na época que fiz foi um dos maiores sucessos da TV Globo e até hoje é um referencial em teledramaturgia. Janete Clair foi talvez a maior novelista brasileira de todos os tempos.

Por que hoje em dia é tão difícil “prender” a audiência com uma trama? Muitas vezes os autores usam o artificio da apelação para alavancar a audiência, concorda com isso?
Como disse antes não sou de analises, mas ha de vez em quando alguns fenômenos entre as novelas, haja vista o estouro de Avenida Brasil. Para prender o publico é necessário uma boa historia e como o Brasil já viu tantas novelas com as mesmas características, com os mesmos atores talvez haja uma saturação. Mas é melhor remédio continua sendo trocar o canal. Se uma novela não é boa, não assista e isso obrigará os canais, os autores e diretores a repensar sobre tal produto, mesmo assim, pode acreditar, fazemos uma das melhores TVs do mundo e nossas novelas são muito bem aceitas internacionalmente. Quanto a apelação a que você se refere, isso é próprio de um veiculo popular. Acho que se você quer qualidade extrema, há ótimas opções que o publico geralmente ignora.

Muitos especialistas já decretaram o fim da novela. O que pensa a respeito?
Já disseram também que o teatro estava morto e ele esta mais firme do que nunca. A teledramaturgia em TV jamais morrerá no Brasil. Somos um pais ainda pobre e novela é uma diversão sem custos que criou raízes em nossa cultura assim como o futebol e o carnaval. Acredito sempre na reformulação e ao longo de nossa historia vimos coisas importantes sendo feitas por grandes idealizadores.

Sua marca mais forte é na televisão, onde atuou em produções emblemáticas como ‘Dona Beija’, ‘Araponga’, entre outras tantas produções. Gostaria que comentasse a sua relação com a televisão.
Minha marca mais forte sempre foi o teatro, onde fiz peças importantes e que ficaram no imaginário de quem assistiu. Perdoe minha autoreferencia, mas nem todo mundo sabe , sou o ator mais premiado do teatro brasileiro. Minha impressão é que eu FAÇO teatro e PARTICIPO da televisão. O teatro é meu universo de paixão. Curto demais fazer novelas. Gosto do ritmo alucinante, da possibilidade de trabalhar com vários colegas ao mesmo tempo, cada dia cenas novo, mas não me sinto dono do meu destino. Meu trabalho depende do Ibope, do humor do novelista, da opinião pública, do fim do meu contrato e tantas outras coisas. No teatro , quando abre o pano , sou dono do meu personagem e da minha vida. Mas que fique bem claro, faço Tevê com uma dedicação enorme.

A TV Manchete com suas produções chegou a ameaçar o reinado da TV Globo no gênero. Como era trabalhar lá? A Manchete pretendia mesmo desbancar a TV Globo?
Tenho lembranças muito positivas da TV Manchete. Fiz sua primeira novela que foi “ A Marquesa de Santos" . Era um período de puro idealismo e estávamos fazendo uma TV nova que fatalmente geraria inúmeros empregos para atores e técnicos em televisão. O ambiente era de pura excitação e gravávamos com muito entusiasmo. Estávamos desbravando um novo campo de trabalho. Durante um bom período a TV Manchete fez grandes produções e chegou ter em seus quadros atores, roteiristas e diretores da melhor qualidade. Não sei se o pessoal de lá pretendia desbancar a TV Globo, mas sei que queriam fazer um trabalho competitivo e também sei que algumas produções chegaram a altos níveis de audiência . Pena que o sonho um dia acabou e com ele muitas pessoas ficaram desempregadas até o surgimento da TV Record.

Em 1996 você atuou em Colégio Brasil, no SBT. Como foi trabalhar na emissora?
Eu não trabalhei no SBT. Fiz uma novela independente, gravada por uma produtora do Roberto Talma. Uma vez acabada ele negociou com as TVs e o SBT comprou e exibiu.

Sua participação no cinema é timida. Qual a razão disso?Dizem que o cinema é o local com a maior concetração de “panelas”, que para um ator entrar é complicado, concorda com isso?
Sempre senti esse clima de panelinha em relação a turma do cinema e como não sei fazer lobby , nem jogo politico e social fui ficando meio a margem . Além do mais sempre tive tanto trabalho fazendo TV e teatro ao mesmo tempo que nunca sobrou disposição para correr atrás . Esta tudo de bom tamanho e tenho a carreira bem sedimentada. Não quero trabalhar como louco e viver pouco. Na verdade estou na época de desfrutar mais a vida e trabalhar com comedimento.

Você já recebeu alguns prêmios (Governador do Estado do Rio de Janeiro, Shell, APCA, entre outros). O que eles representam para você?
Tenho vários prêmios de teatro. Segundo alguns dados, sou o ator mais premiado do teatro brasileiro, mas não é por causa disso que durmo em cima dos louros. Luto ferozmente para sempre apresentar um bom trabalho. Estud, tenho disciplina, sou persistente. Por ter ganho tantos prêmios acho que me impulsiono mais ainda para não decepcionar a quem me assiste . Para quem saiu de um bairro de italianos em SP, a Mooca, que naõ tinha o habito de assistir teatro ou veleidades culturais, os prêmios, para mim, talvez signifiquem o reconhecimento em relação aquele garoto que um dia ousou ser artista .