Matheus é pesquisador e um dos idealizadores da Revista Zingu! (http://www.revistazingu.net/).
Você é um dos criadores da Revista Zingu! que está há mais de cinco anos no “ar”. Como surgiu a sua ideia? Quais as dores e as delicias de manter um trabalho desse na internet?
É uma alegria a publicação estar completando cinco anos. Na realidade, eu criei a Zingu em outubro de 2006 e convidei alguns amigos para participarem. Era uma coisa completamente amadora, não tínhamos ideia que iria durar tanto tempo. Inclusive eu que dei o nome. A proposta inicial era falar de filmes e pessoas do cinema paulista que não tem espaço na grande mídia. Na época que criei, haviam várias revistas eletrônicas de cinema e nenhuma dava atenção ao cinema brasileiro popular. Como eu sabia que pessoas e filmes mereciam ser redescobertos, acredito que a publicação vem cumprindo a sua função. Muitas pessoas que dedicamos os dossiês acabam virando amigos pessoais e nosso trabalho ajuda essas pessoas. Essa é a melhor parte. As maiores dores são pessoas que utilizam o conteúdo da publicação em matérias e obras literárias e não nos citam como fonte. Juridicamente, eu poderia processar essas pessoas.
Você é um pesquisador e estudioso em cinema, com um olhar mais direcionado para a produção da Boca do Lixo. Conte qual a importância do curta-metragem nesse período.
Nesse período, muitos curtas eram produzidos graças á lei de obrigatoriedade. Por isso, o pessoal que estava começando na profissão acabava fazendo curtas-metragens. Existiam os filmes com episódios que tornavam as produções mais baratas. Isso foi feito diversas vezes na Boca e sempre tiveram boa presença de público. Atualmente, os filmes de episódio não são explorados.
Quais curtas da Boca você destaca?
"Festa na Boca" de Ozualdo Candeias, "Essa Rua Tão Augusta" de Carlos Reichenbach. De episódios que foram colocados dentro de longas-metragens posso destacar vários. Me lembro de "O Pasteleiro", 1 e 3 em "Caçadas Eróticas" de David Cardoso, "A Peça de Ousadia" de Luiz Castillini, "A Viúva do Doutor Vidal" de "Aqui, Tarados", de Ody Fraga, "Belinha, a Virgem" de "As Safadas", de Antônio Meliande, "O Despejo" de 'Cada Um Dá o Que Tem" de Adriano Stuart. Mas tem muita coisa interessante porque é uma produção gigantesca, eles tinham uma verdadeira indústria.
Qual ator, atriz e diretor desta geração que você considera com o “espírito” da Boca do Lixo?
São diversos. Mas como você está pedindo um em cada categoria, eu escolheria o David Cardoso como ator, a Helena Ramos como atriz e o Ody Fraga como diretor.
Por que os curtas não tem espaço em críticas de jornais e atenção da mídia em geral?
Essa é uma pergunta complicada. Em geral, o jornalismo cultural e cinematográfico feito no Brasil é ruim. O curta-metragem merece atenção, principalmente por lançar diversos jovens realizadores. Gente consagrada como Beto Brant, Jorge Furtado e Sérgio Bianchi (só para citar alguns) começaram a carreira fazendo curtas. Programas como o Zoom na TV Cultura e as exibições diárias no Canal Brasil são importantes. Mas esse tipo de filme deveria ter mais espaços nas salas de cinema. Na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, vejo diversas sessões de curtas brasileiros e o publico sempre gosta bastante. Lembro de um documentário sobre o Barão de Itararé e muita gente aplaudiu na sessão. Foi algo muito bonito. Essa ideia que o curta deve ficar restrito a um público seleto é pura bobagem e preconceito. O filme de menor duração tem apelo com o grande público. Infelizmente, somos um país que não prestigia a sua própria cultura. O pouco espaço para o curta-metragem acaba sendo conseqüência disso.
Como deveria ser a exibição de curtas para atrair mais público? Na época da Boca existia a Lei do Curta que nunca era respeitada.
O público gosta de ver curtas brasileiros quando eles tem temas interessantes. Nas sessões de Tropa de Elite 2, antes do longa, foi exibido um curta com o Wagner Moura que teve grande sucesso com o público. Não gosto de misturar política com cultura, mas uma lei de obrigatoriedade seria algo importante. Os realizadores e o público que gosta de cinema brasileiro iriam agradecer.
É possível ser um cineasta só de curta-metragem?
Muita gente irá dizer que não. Mas é possível. O Primo Carbonari nunca dirigiu um único longa-metragem. Mas você vai dizer que ele não tem uma obra? Pode ser que os filmes dele tenham uma série de equívocos. Mas os trabalhos dele tem um valor inegável e são documentos históricos.
Vemos que o curta é sempre um trampolim para fazer um longa. O curta-metragem é marginalizado entre os próprios cineastas? Na Boca era assim?
O curta sempre foi olhado como um trampolim. Quando o Joaquim Pedro de Andrade fez Couro de Gato, ele esperava chegar num longa. Na Boca funcionava da mesma maneira.
Pensa em dirigir um curta futuramente?
Penso em trabalhar com documentários. Gostaria muito de fazer algo sobre ex-jogadores profissionais que atuaram somente por equipes menores e não são lembrados. O futebol do interior de São Paulo é um universo de muitas histórias e personagens interessantíssimos.
Qual é o seu próximo projeto?
São diversos, porque meu trabalho não se restringe a Zingu. Mas uma das minhas grandes paixões é o Cinema da Boca. Pesquiso o assunto desde 2006. Por isso, estou com dois projetos de livro para um futuro próximo sobre a produção cinematográfica da Rua do Triunfo.