Roteirista, produtora e cineasta. Dirigiu o curta-metragem “Fez a barba e o choro”.
Conte sobre a sua experiência em
trabalhar em produções em curta-metragem.
A maior parte de minha produção são curtas-metragens. O primeiro curta
que dirigi profissionalmente foi realizado com pouco orçamento, nada de
pretensão, mas muito amor à camiseta, por parte de todos os envolvidos. Foi uma
experiência intensa, mas ao mesmo tempo muito bonita. Depois o filme foi
colocado num festival e acabou ganhando. Começamos a ganhar confiança e
escrevê-los em muitos festivais. O filme foi arrecadando muitos prêmios
nacionais, até que ganhamos a versão ibero-americana do Prix Jeunesse, o maior
festival de conteúdo infanto-juvenil do mundo. Entre os prêmios, ganhamos uma
passagem para ir assistir ao filme que seria exibido na versão internacional do
festival, que acontece na Alemanha. Inscrevemos o filme lá também e entramos na
mostra competitiva. A recepção foi incrível e saímos de lá com o Next
Generation Prize e em segundo lugar na competitiva geral da categoria (perdemos
apenas para uma produção da BBC, o que me deixa muito orgulhosa). Depois disso
dirigi outros documentários, e escrevi outros curtas conjuntamente com amigos.
O curta-metragem sempre nos proporciona experiências muito ricas e ainda que a
maior janela de divulgação sejam os festivais, é possível fazer um curta que
tenha uma linda carreira de festivais, o que é muito compensador.
Por que os curtas não têm espaço em
críticas de jornais e atenção da mídia em geral?
Acredito que exatamente pela razão que mencionei anteriormente: Por que
o longa-metragem exerce uma dominação sobre o conceito "filme" na
nossa mente, e por isso as possibilidades de exibição são reduzidas e em geral
não são focadas no curta em si. A maioria das exibições de um curta são ou
televisivas ou exibições em festivais. O que acontece na crítica resultante da
exibição em festivais é que o crítico não está avaliando uma obra, mas uma
mostra, e que tem acesso aos curtas de um festival acaba sendo exposto a um
numero muito maior de obras do que o critico que escreve sobre os longas desse
mesmo festival. E assim os curtas dividem a atenção e o espaço de texto desse
crítico, resultando num texto menos aprofundado. E no caso da exibição de
curtas nos cinemas, por exemplo, eles são colocados ali como um bônus pra quem
vai assistir a um longa-metragem, ou seja, eles não são o foco daquela
atividade. Quer dizer, a pessoa escolhe ver um longa e vai no cinema com esse
intuito, muitas vezes, SE vai passar um curta-metragem antes ele sequer é
divulgado como uma obra adicional da mesma sessão, e o espectador simplesmente
não foi lá para vê-la, ainda que termine gostando.
Na sua opinião, como deveria ser a
exibição dos curtas para atingir mais público?
Na minha opinião o sistema de exibição está mudando para todo o cinema,
não só para o curta. Não sei dizer muito bem para onde está indo, mas tenho
lido muito sobre isso e acredito que a internet está mudando o conceito que
temos sobre o que consideramos "filme" e "exibição". É só
olhar o material que as pessoas compartilham nas redes sociais, por exemplo.
Não é raro ver alguém postando coisas como "Olha que legal esse 'vídeo'
sobre meio ambiente" ou "Esse 'vídeo' é uma animação muito legal
sobre não-sei-o-que". Na verdade tem uma grande parte desse material que
são nada mais nada menos do que curtas-metragens que estão sendo compartilhados
e vistos por centenas de pessoas, portanto não dá pra ignorar que isso é uma
nova janela de exibição. Esses dias li uma reportagem onde o Spielberg e o
George Lucas falavam sobre a falência do sistema de produção e distribuição dos
grandes estúdios de Hollywood. Eles basicamente falam que vai haver uma
implosão desse sistema e que apenas algumas poucas produções vão ser feitas com
os mega-orçamentos que eles estão acostumados. De resto vão começar a surgir
muitos outros filmes de orçamentos menores. Se isso acontecer esses filmes
menores também precisarão encontrar novas janelas de exibição, assim como os
curtas já fazem, e talvez a internet seja um caminho alternativo para a
exibição desses filmes.
O curta-metragem para um profissional
(seja ele da atuação, direção ou produção) é o grande campo de liberdade para
experimentação?
Claro, porque o curta não tem uma estrutura tão rígida quanto a de um
longa. A pessoa que assiste a um curta espera ver essa liberdade, espera ver
algo diferente, novo. Assim como os mecanismos de seleção são mais flexíveis.
Se espera de um curta que ele seja inovador, ao passo que em termos de
produção, pode ser difícil aprovar um longa inovador. Simplesmente pelo fato de
que quem seleciona e aprova os roteiros de longa sabem que investir numa obra
maior pressupõe um gasto considerável, e por isso preferem apostar em estruturas
conhecidas, cujos resultados e retornos são mais certeiros (e por consequência
mais conservadores).
O curta-metragem é um trampolim para
fazer um longa?
Não exatamente, ele possibilita sim a entrada de novos realizadores no
mercado, e a visibilidade do curta pode ser reconhecida na hora desse
realizador tentar fazer um longa-metragem. É algo a se colocar no currículo, e
algo no currículo é sempre melhor do que nada. Mas uma coisa não
necessariamente leva a outra.
Qual é a receita para vencer no
audiovisual brasileiro?
Realmente não acredito que haja uma receita. Tem que ser muito
insistente e paciente. Tem que se estar preparado para falhar muitas vezes até
ter sucesso nas realizações - e não desistir no meio do caminho. Parece
bobagem, mas vi muita gente boa desistir de fazer cinema por encher o saco do
nosso terreno acidentado. Acho que todo o realizador tem que ser crítico
consigo mesmo também, tem gente que faz os primeiros trabalhos e vai
razoavelmente bem e sai achando que é o cara, daí acaba não evoluindo em sua
carreira. Mas como eu disse, isso é minha opinião baseada em observações, é
completamente pessoal, longe de ser uma receita. Aliás, se houver uma receita e
tu descobrir primeiro, me avisa, ok?
Pensa em dirigir um curta futuramente?
Claro, estou sempre
pensando em dirigir curtas. É um formato que eu adoro e além disso tenho muitos
roteiros prontos esperando para serem produzidos.