domingo, 22 de novembro de 2015

Rodrigo Arijon


Ator e cineasta. Atuou nos curtas-metragens "Às 7, às 3 e às 11", de Renato Chiappetta, "9:32 a.m", de Alex Miranda e "Fim", de Peppe Siffredi e Marcelo Mesquita.

O que te faz aceitar participar de produções em curta-metragem.
São diversos fatores, desde amizade e afinidade com os realizadores, enxergar a proposta como um desafio... mas acima de tudo tem que ter uma boa ideia no roteiro. Algo diferente. Até porque eu acredito que o formato curta-metragem é incrivelmente mais difícil de se acertar do que um longa-metragem. Claro, o longa é muito mais complexo do ponto de vista logístico e financeiro, mas todo mundo (equipe e público) entendem o formato. Ou, pelo menos, sabem o que esperar dele.

No curta, é difícil acertar a mão. É um formato de "fácil" realização, mas enquanto estrutura narrativa é um tanto complexo. Pela curta duração, é difícil desenvolver com propriedade personagens ou histórias de forma satisfatória. É mais complicado de envolver o público, fisgá-lo. É mais fácil trabalhar com uma situação, um momento, ou até mesmo a estrutura de uma anedota, que talvez tenha uma grande surpresa ou punchline no final. Ou partir para algo mais experimental mesmo.

Conte sobre a sua experiência em trabalhar em produções em curta-metragem.
Trabalhei em alguns curtas, sejam de amigos, ou de diretores com quem havia trabalhado em outras produções. É sempre prazeroso participar de um curta, pois cinema é trabalho de equipe, colaborativo. Cada um é uma peça de uma grande engrenagem, num esforço colaborativo. Destaco "Às 7, às 3 e às 11", de Renato Chiappetta, "9:32 a.m", de Alex Miranda e "Fim", de Peppe Siffredi e Marcelo Mesquita. O tempo é sempre curto, as condições não costumam ser ideais, mas estamos sempre buscando a melhor forma de se fazer um bom trabalho, independente da situação. Aliás, o "fazer cinema" não costuma ter muito glamour não! Mas fazemos por paixão.

Por que os curtas não têm espaço em críticas de jornais e atenção da mídia em geral?
Porque é um formato comercialmente difícil. Afinal, como você vai vender um curta? E onde vai exibi-lo? Se isso não está muito bem resolvido, por que a mídia dará atenção a algo que não consegue encontrar o seu público?  Ao mesmo tempo, sem divulgação não se consegue exibição. É como a questão do ovo e da galinha. Salvo alguns raros programas de TV, não é muito fácil assistir um curta fora do circuito de festivais. Mas a internet, e principalmente plataformas de vídeo como YouTube e Vimeo, mudaram bastante esse cenário.

Na sua opinião, como deveria ser a exibição dos curtas para atingir mais público?
Como acabei de mencionar, a internet hoje em dia permite que um grande número de pessoas possa ter acesso a curtas-metragens. Isso era inviável tempos atrás. É fácil você esbarrar com algum curta desconhecido no YouTube e descobrir algo bastante interessante. Foi assim, por exemplo, que descobri pequenas jóias de um excelente produtora australiana, a Blue-Tongue Films (http://www.youtube.com/user/bluetonguefilms). Um conglomerado de cineastas inquietos, que realizam curtas inventivos e com bastante frescor narrativo. Adoro recomendar esse curtas, então vou tomar esse espaço para isso também:

- Spider, de Nash Edgerton:  http://www.youtube.com/watch?v=Jmbv8kevQ-E

- I Love Sarah Jane, de Spencer Susser:  http://www.youtube.com/watch?v=gYxs7Y7ulrM

- e Miracle Fish, de Luke Doolan (que foi indicado ao Oscar, inclusive): http://www.youtube.com/watch?v=9cpKY2XI1NY

A internet tem sido, cada vez mais, a melhor plataforma para divulgação de trabalhos mais autorais. É extremamente democrática.

Mas fico imaginando que, além disso, uma boa ideia seria atrelar a exibição de curtas antes dos longas-metragens. Como a Pixar faz com suas animações: sempre tem um curta antes do filme em si. Os estúdios e produtores poderiam pensar em associar curtas de forma temáticas aos longas-metragens. Pensando na forma mais simples: curtas de terror junto de longas de terror, e assim por diante. E nos lançamentos em DVD e Blu-Ray, o mesmo raciocínio.

O curta-metragem para um profissional (seja ele da atuação, direção ou produção) é o grande campo de liberdade para experimentação?
Acredito que sim. É um dos principais espaços para isso. Não existe a cobrança de algum grande estúdio por trás, nem a obrigação de retorno financeiro durante sua trajetória comercial. Então, por que não se arriscar mais do que o normal? 

Me lembrei agora de uma esquete que praticamente virou um curta, tamanha a originalidade e a inventividade do resultado. Chama-se "Eu Já Sabia" (http://www.youtube.com/watch?v=t4bBih0w-ic), do grupo Olaria GB. O diretor dessa pérola, Daniel Nascimento, acertou na mosca. É um tanto experimental, e ao mesmo tempo busca um diálogo com o espectador. É um achado.

O curta-metragem é um trampolim para fazer um longa?
Seja para atores e diretores (assim como outras funções), é um excelente trampolim. É uma vitrine do seu trabalho. Do que você pode fazer, ainda mais com pouco tempo de filmagem e poucos recursos. Talvez seja o caminho mais natural a se percorrer: fazer alguns curtas, e depois ir para os longas.  Aliás, muitos curtas servem de base para se desenvolver longas com a mesma trama e mais profundidade. Filmes como “Boogie Nights”, “Jogos Mortais” e “Distrito 9” foram baseados em curtas dos mesmos diretores.

Qual é a receita para vencer no audiovisual brasileiro?
Entender o público e não subjugá-lo. Não é porque o brasileiro assiste Zorra Total que ele só pode apreciar um humor popularesco e sem qualidade, por exemplo. Inúmeras comédias, com qualidade artística sofrível, são despejadas nos cinemas ano a ano, sem dó.  Parece que só fazem filmes excessivamente comerciais, ou filmes intelectuais demais. Não existe filme médio no Brasil. E acredito que esse meio termo é que ajudaria a fomentar uma indústria cinematográfica mais forte. E sair da mesmice dos temas. Por exemplo, nunca deixarão de fazer filmes sobre a ditadura e seus efeitos, mas que busquem outros assuntos ou mesmo outras visões. Chega de olhar sempre para o passado, e no mesmo momento histórico. Que se investigue o cinema de gênero também. Para o cinema brasileiro andar com as próprias pernas, ele precisa saber se vender. E buscar esse diálogo com o público.

Talvez o melhor exemplo disso tudo seja “Cidade de Deus”, do Fernando Meirelles. Um assunto já batido (favela, tráfico, pobreza), mas feito com um olhar absolutamente inovador, tanto no roteiro como na direção e nos aspectos técnicos. Aliás, a qualidade técnica do filme é assustadora. Tanto é que foi indicado para diversos Oscars. E tudo isso sem um grande nome conhecido no elenco. E Meirelles também não era conhecido do grande público. Resultado: sucesso de bilheteria.

Pensa em dirigir um curta futuramente?
Já dirigi dois curtas. Um deles, chamado "Pong Pong", inclusive serviu de inspiração para "Às 7, às 3 e às 11", que já mencionei. Mas já faz bastante tempo. Gostaria de dirigir mais algum, sim. Ideias na cabeça não faltam. Quem sabe logo mais? Ainda mais agora, que a internet permite todo esse alcance.